Me afasto sentindo todo o peso do futuro que a política nos reserva. Imagino golpe, contragolpe, torturas, execuções, barricadas pelas ruas. Ao meu redor, a realidade vira um filme em preto e branco com civis estropiados em meio a ruínas. Bombas chovem do céu. “Estamos ferrados!”, digo ao amigo, que responde com um silêncio soturno. Ou talvez ele não tenha entendido o que eu disse. “Estamos ferrados!”, repito mais alto, só para ter certeza. Silêncio. 204r39
Eis então que decido: não vou dormir tendo pesadelos niilistas com juventudes radicalizadas em guerra num futuro necessariamente distópico. “Sou jornalista!”, digo pateticamente ao amigo. Dou um meia-volta, volver! e sigo em direção ao pelotão. Me aproximo e espero o sargento-mirim dar instruções a outro menino nerd que se junta às fileiras. Como se estivesse falando com uma autoridade de um metro e meio, pigarreio antes de perguntar, ou melhor, indagar: “O que é...? O que é...? Isso daqui?”. Gesticulo como se estivesse pintando uma tela surreal. Ou ando reboco numa parede imaginária.
O sargento-mirim abre aquele sorriso atrevido de quem acredita no personagem, estufa o peito e, todo orgulhoso, responde naquela voz que ainda sobe e desce sob influência dos hormônios da puberdade: “Isso daqui, senhor, é um curso preparatório para as Forças Armadas”. Ufa, mil vezes ufa, penso. Mas não digo. Tão mais emocionante (ainda que desesperadora) era a fantasia...!