O segundo e mais recente equívoco foi a proposta de financiamento do Renda Cidadã através da limitação do gasto anual com precatórios – dívidas do Estado reconhecidas em processos judiciais. Ou seja, Bolsonaro propôs dar calote em calotes ados para financiar novos gastos. O Brasil nunca foi um país sério e o presidente, que se diz conservador, quer manter a tradição.
Nas últimas semanas, os mercados têm reagido a esse "Lollapalooza" de más ideias que caracteriza as mais recentes propostas econômicas do governo. A curva de juros “empinou” – se o leitor ouviu esse jargão por aí, mas não entendeu do que se trata, fique calmo e leia esta coluna que escrevi para você. A taxa de câmbio segue o mesmo movimento. Em 2020, o real é uma das moedas que mais se desvalorizou frente ao dólar. Todos enfrentam a pandemia, mas o Brasil luta também contra fontes internas de incerteza.
Muito desta instabilidade se deve ao fato de o governo ter abandonado o discurso fiscalista e cogitar a proeza de piorar um sistema tributário que já parecia tão ruim quanto possível. Bolsonaro parece crer que a reforma da Previdência foi suficiente para colocar as contas públicas no trilho. Não é verdade. A reforma previdenciária apenas ganhou tempo de batalha numa guerra que tem sido travada em toda a história brasileira: o combate entre a responsabilidade e os vendedores de sonhos que viram voos de galinha. Vale lembrar que a reforma não cortou gastos previdenciários, apenas diminuiu a taxa de crescimento deles a médio e longo prazo.
Bolsonaro experimentou a droga do gasto público que tenta comprar popularidade. Muitos políticos já se viciaram nisso. O perigo é que, como ocorre noutras drogas, o prazer é ageiro e os danos causados pela dependência são muito difíceis de serem revertidos. Não há garantia na compra: é possível, e até provável, que os custos da irresponsabilidade apareçam ainda antes das eleições de 2022. Mesmo observando apenas o cálculo do poder, nada seria tão desastroso para o presidente quanto uma nova crise econômica.
Se o governo quiser deixar um legado positivo para o país, e mesmo se apenas quiser ganhar poder, a melhor alternativa na mesa é também a correta: apresentar um plano crível de ajuste fiscal, ao mesmo tempo em que aumenta a eficiência do gasto público. Uma das únicas vantagens da bagunça brasileira é que o Estado pode melhorar sem aumentar. Há muito mato alto que pode ser cortado, como diz uma gíria do mercado financeiro.
O caminho correto, porém, não é o mais fácil. Aumentar a eficiência do Estado desagrada aqueles que lucram com a ineficiência – no Brasil, não são poucos. Fazer o certo exige clareza de propósito e disposição para travar batalhas necessárias. Bolsonaro, por sua vez, não parece disposto a decepcionar servidores públicos da ativa e beneficiários de programas sociais mal desenhados, como o abono salarial.
Entre umas e outras ideias mirabolantes, o real derrete, o presidente critica a falta de patriotismo da Faria Lima e o Brasil se desvia do caminho da prosperidade que lhe foi prometido em 2018.
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