Como acontece em qualquer regime onde os que mandam se dão o direito de decidirem tudo, sem respeito a nenhum tipo de limite, o STF também não se obriga a obedecer à lógica comum. A presidente do tribunal, ora em vias de se aposentar, disse tempos atrás que o quebra-quebra do dia 8 de janeiro em Brasília foi um novo “Pearl Harbour” – o ataque aéreo japonês que matou 2.400 pessoas no Havaí, em 1940, e fez os Estados Unidos entrarem na Segunda Guerra Mundial.
Não tem pé nem cabeça, é claro, mas o mínimo que o STF podia fazer em deferência a esse desvario seria um julgamento público, com o máximo de exposição dos condenados. Está fazendo o contrário. Depois do show de abertura, e dos protestos que provocou pela flagrante violação das leis penais brasileiras, o processo virou “virtual”. Os advogados não poderão fazer a defesa oral – um direito básico de qualquer acusado. Não haverá debate entre os julgadores. Tudo volta a ser empurrado para baixo do computador. É algo tão doentio que até a Ordem dos Advogados do Brasil protestou.
Depois da excitação inicial, os ministros acharam mais conveniente se esconder do público. Não querem que o cidadão veja com seus próprios olhos réus serem condenados a 17 anos de cadeia por participarem de uma arruaça. Não querem mostrar para o público que as pessoas estão sendo punidas duas vezes pela mesma coisa, “golpe de Estado” e “abolição violenta do estado democrático de direito” – um truque primitivo para somar duas penas e dobrar o tempo de prisão.
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Não querem que os advogados digam na frente de todo mundo que os seus clientes estão sendo acusados de um crime impossível; sua chance real de dar um golpe sempre esteve entre o zero e o triplo zero. Não querem que o povo ouça seu argumento de que não é preciso haver provas contra os réus – culpado não é quem fez isso ou aquilo, mas quem o inquisidor-chefe do processo decide que é culpado.
É assim que funciona o STF de hoje. Quando há provas indiscutíveis contra alguém que os ministros querem proteger, as provas são anuladas. Quando não há prova nenhuma contra alguém que querem perseguir, as provas não são necessárias. Como sempre ocorre quando quem tem a força deixa de ter limites, o Sistema de Justiça é substituído pela anarquia – o que vale não é a lei, é a vontade individual dos donos do governo. É inevitável que fique do jeito que está.