Como número redondo, os tais 600 bilhões são uma soma impressionante e que tendem a chamar a atenção dos eleitores. Presume-se que basta dar uma ordem para devolver parte desses recursos aos cofres públicos e, voilà, a conta do tal arcabouço fiscal fica no azul. Mas isso não a de mágica de circo chinfrim.
Se colocados sob uma lupa, os valores das desonerações impactam em setores sensíveis. A começar pela agricultura, que tem uma desoneração de R$ 53 bilhões. Haddad pretende dar uma tesourada ali, diminuindo a competitividade dos produtores e aumentando o custo do alimento na mesa dos brasileiros? E as entidades sem fins lucrativos, incluindo a redes hospitalares? Estas consomem R$ 40 bilhões. O Simples Nacional, por sua vez, tem um subsídio de R$ 118 bilhões. Vai tirar o benefício das micro e pequenas empresas que estão num regime tributário diferenciado? Topa arcar com o custo social disso? Não parece que Lula seja esse tipo de político.
O problema é apelar ao discurso fácil e fazer demagogia em cima de uma questão tão complexa.
É importante lembrar que foi Dilma Rousseff a campeã das desonerações. Usou esse instrumento de maneira a retardar e maquiar as condições da economia brasileira quando esta já tinha ido para o vinagre no último mandato do PT. Também faltam estudos para embasar tais cortes. Quais dessas desonerações foram positivas? Quais foram ineficazes? Só com dados é possível determinar o que se encerra, o que se diminui e o que se mantém.
Da forma como Haddad colocou, até parece que o Estado está sendo vítima de empresários inescrupulosos que sugam as verbas públicas em nome de seus interesses. A fala os trata como criminosos saqueadores do erário. Não o são, ainda que desonerações possam e devam ser analisadas com cuidado. O problema, por óbvio, é apelar ao discurso fácil e fazer demagogia em cima de uma questão tão complexa.
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Outro problema que já se observa é a dificuldade em atingir um ritmo equilibrado entre o crescimento da despesa e o crescimento da receita. Ainda que o governo obtenha novas fontes de recursos para compensar os gastos gerados, quem garante que serão suficientes? Até aqui as novas despesas criadas não foram compensadas em igual medida por novas fontes de financiamento.
Enquanto Lula continua com sua guerrinha oportunista contra o Banco Central e a base no Congresso Nacional permanece desarticulada e pouco interessada em aderir à agenda do Palácio do Planalto, o ministro da Fazenda e sua equipe batem cabeça para fechar a conta de um arcabouço que ainda nem foi aprovado mas já parece insustentável. A matemática é como é: exata e implacável. Já a desejada por Lula é impossível, e aprofunda o abismo econômico.