Uma espera que é o corpo o primeiro professor a ensinar como lidar. A espera primeiro sangra, mês a mês. Uma espera dolorosa, física e psíquica, que no seu fim provisório devolve à mesma espera. Se fecundado, o útero também será refeito em nova espera depois. Uma espera diferente, que nutre, guarda, protege, acalenta e preenche a vida com vida. Mas uma espera, de qualquer forma. Uma espera que, no seu fim, contém também a dor, uma dor incomparável, que devolve o útero a tantas outras esperas.

A espera agora que dói na alma. A espera da febre abaixar, do dente cair, da volta do primeiro dia na escola, quando aos cuidados de outros e, depois, aos cuidados de ninguém, a não ser dos filhos mesmos. As esperas com o coração nas mãos dos retornos das saídas à noite, mas também as esperas alegres para os almoços de domingo quando já não moram mais “em casa”, da ceia de Natal, dos aniversários. É uma espera nunca vazia, portanto. Quem sabe com um poema isso fique mais claro. É de Wyslawa Szymborska, poetisa polonesa que acabei de conhecer, justo porque estamos a viajar literariamente pela Polônia lá no clube:

“Mulher, qual é o seu nome?” “Não sei.”
“Quantos anos você tem?” “Não sei.”
“Por que você cavou esse buraco?” “Não sei.”
“Há quanto tempo está escondida?” “Não sei.”
“Por que você mordeu meu dedo?” “Não sei.”
“Você sabe que não irei machucá-la?” “Não sei.”
“De que lado você está?” “Não sei.”
“Estamos em guerra, você tem que escolher.” “Não sei.”
Seu vilarejo ainda existe?” “Não sei.”
“Aqueles são seus filhos?” “Sim.”

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Quanta espera nos silêncios contidos em tantos nãos e no único e imenso sim. Aprendi muito sobre o silêncio da mulher, como falam com o olhar, como guardam as coisas no coração. Aprendi que o que parece fragilidade é apenas uma sensibilidade mais apurada que as torna mais resilientes do que parecem. Eis a mulher, que não é menos mulher se não tem ou espera filhos, seja porque não quis ou não pôde ser mãe. Muito menos é menos mulher porque casou ou não. Nada disso define a mulher, não como essas esperas, esses silêncios, esses mistérios e enigmas que só são decifrados pelos “sim” que a mulher dá, ainda que sejam poucos, ainda que seja um só.

Quando o “sim” é à literatura, descobri e compreendi a felicidade clandestina que só as mulheres possuem. Nunca vi as participantes do clube tristes com seus livros. São todas como a menina personagem de Clarice Lispector no seu famoso conto, em que essa espera amorosa é tão bem retratada:

“Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui ear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre iria ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar… Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada.
Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo.
Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.”