Em relação a todos eles, ainda, a última palavra sobre a sua culpa é da Justiça, e os tribunais vêm anulando os casos com base em questões formais, em geral, como a interpretação de regras sobre qual justiça deveria julgá-los. Enquanto as portas das prisões vêm sendo abertas para condenados por corrupção de centenas de milhões de reais, Bretas é o culpado. De fato, há provas consistentes e públicas de seu trabalho contra a corrupção.

Já em relação às acusações contra ele no Conselho Nacional de Justiça, o órgão impôs sigilo sobre o procedimento e a decisão, impedindo que o juiz se defenda publicamente e que a decisão do Conselho seja escrutinada pela sociedade. Esse escrutínio é mais importante quando se trata do afastamento de um juiz, um ato tão drástico e impactante sobre a independência judicial, ainda mais quando a decisão dos conselheiros não foi unânime.

Só o que existe é a prova de um trabalho abnegado e corajoso que incomodou muitos criminosos poderosos e desarticulou a organização criminosa mais perigosa que tomou conta do Rio de Janeiro – e não me refiro aos traficantes.

Mesmo estando o procedimento sob sigilo, as acusações foram divulgadas por parte da imprensa, mas nada veio a público de consistente contra o juiz. Não há triplex, sítio, contas no exterior, joias, bolsas luxuosas, malas de dinheiro, barras de ouro, diamantes, farras de guardanapos nem dinheiro na cueca. Só o que existe é a prova de um trabalho abnegado e corajoso que incomodou muitos criminosos poderosos e desarticulou a organização criminosa mais perigosa que tomou conta do Rio de Janeiro – e não me refiro aos traficantes.

Refiro-me a criminosos que roubaram, mataram ou prejudicaram milhões, mas fizeram isso usando gravatas, de dentro de seus palácios. Eles usaram, como arma, as suas canetas. E cada organização criminosa usa as suas próprias armas para reagir contra os agentes da lei. Neste caso, a reação não vem com balas, mas com a tinta no papel, por meio da reação patrocinada por caros advogados e apoiada por aliados políticos que influenciam a própria seleção dos conselheiros do CNJ e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

A pressão política vem surtindo efeito. Em recente decisão, o CNMP puniu o procurador coordenador da força-tarefa da Lava Jato do Rio de Janeiro com a pena de demissão, que foi convertida em suspensão

De fato, a indicação dos conselheiros precisa ser aprovada pelo Senado, que, no ado recente, recusou nomes simpáticos à operação Lava Jato e utilizou as sabatinas para mandar recados claros. Numa delas, um senador perguntou: “Vossas excelências estarão daqui a mais uns dias tomando posse [como conselheiros do CNMP]. Se cair na mão de Vossas Excelências [o caso envolvendo Deltan], qual seria a conduta, a maneira que os senhores iriam se posicionar, já que estão fazendo parte de um órgão que é controlador?”

A pressão política vem surtindo efeito. Em recente decisão, por exemplo, o CNMP puniu o procurador coordenador da força-tarefa da Lava Jato do Rio de Janeiro com a pena de demissão, que foi convertida em suspensão. Qual o seu crime? Nenhum. Ele foi punido por ter dado divulgação na imprensa a uma denúncia contra Edison Lobão e Romero Jucá. A denúncia, por definição, é pública e nada impede sua divulgação. Contudo, um assessor a registrou nos sistemas da Justiça, por equívoco, como sigilosa. Em questão de dias, o juiz levantou o sigilo, reconhecendo que deveria ser pública.

O sistema está em busca de pretextos, está procurando pelos em ovos, para punir os agentes de lei que trabalharam contra a corrupção política.

Como se vê, o sistema está em busca de pretextos, está procurando pelos em ovos, para punir os agentes de lei que trabalharam contra a corrupção política. Ironicamente, Edison Lobão e Romero Jucá estavam na terça-feira no auditório do CNJ, na cerimônia de recondução de um dos seus conselheiros, no mesmo dia da punição de Bretas pelo órgão.

Nunca vou esquecer o recado que esse mesmo conselheiro, quando estava no CNMP, deu aos procuradores da Lava Jato quando fez uma visita de cortesia à força-tarefa da operação Lava Jato, em Curitiba: “Não queremos puni-los, mas vocês têm que me ajudar a ajudar vocês”. A frase, que ficou famosa na boca de um personagem corrupto do filme Tropa de Elite, caiu muito mal.

A imprensa anunciou que Cabral e Pezão comemoraram a punição de Bretas. Reportou-se ainda que as defesas de variados réus buscarão a anulação das suas condenações na Lava Jato do Rio de Janeiro. Renan Calheiros comemorou a decisão no Twitter:

O que ele disse, para bom entendedor, foi mais ou menos o seguinte:

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No Sermão do Bom Ladrão, em 1655, Padre Antonio Vieira comparou o tratamento dado aos ladrões de galinhas e aos governantes ladrões: “Não são só ladrões, diz o santo, os que cortam bolsas ou espreitam os que se vão banhar, para lhes colher a roupa: os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões, ou o governo das províncias, ou a istração das cidades, os quais já com manha, já com força, roubam e despojam os povos. — Os outros ladrões roubam um homem: estes roubam cidades e reinos; os outros furtam debaixo do seu risco: estes sem temor, nem perigo; os outros, se furtam, são enforcados: estes furtam e enforcam”.

Os verdadeiros ladrões no Brasil ainda são os governantes ladrões que roubam e enforcam. Desde 1655, não mudou muita coisa por aqui. Nossa indignação precisa se transformar em força política – nas redes sociais, nas ações parlamentares e nos votos – para dizermos: basta!