Na decisão recente, os ministros do STJ entenderam que a chamada busca pessoal – prática popularmente conhecida como “abordagem”, “revista”, “geral”, entre outros – feita por agentes de segurança é ilegal, caso seja realizada sob a alegação de atitude suspeita ou mesmo a partir de denúncias anônimas.
Para o STJ, a fundada suspeita – item previsto no Código Processo Penal (P) para determinar a possibilidade da busca pessoal sem mandado judicial – só se concretiza se os policiais comprovarem, de forma “descrita com a maior precisão possível, aferida de modo objetivo e devidamente justificada pelos indícios e circunstâncias do caso concreto”, que o indivíduo esteja na posse de drogas, armas ou outros objetos que constituam corpo de delito. Em termos práticos, além de inviabilizar as abordagens, a medida abriria caminho para que cidadãos flagrados com objetos comprovadamente ilícitos em abordagens policiais questionem a forma como a busca se deu e tentem anular as denúncias contra eles.
Na avaliação do Consesp, entretanto, não houve restrição legal às abordagens por parte do STJ, e a decisão do tribunal não tem amplitude geral, isto é, vale apenas no contexto do caso específico julgado pelo órgão.
“Nós respeitamos a decisão do STJ; o Conselho não se opõe ao Judiciário. Mas houve a análise de um caso concreto, um caso específico de uma abordagem que aconteceu na Bahia. Por isso, a decisão não tem o poder de limitar que as abordagens sejam realizadas quando houver fundada suspeita”, afirma Júlio Danilo Souza Ferreira, presidente do Consesp e secretário de segurança pública do Distrito Federal.
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O caso específico ao qual Ferreira se refere é o objeto do julgamento do STJ na referida decisão. Trata-se de um homem denunciado pelo Ministério Público da Bahia por tráfico de drogas. O rapaz foi abordado por policiais ao circular em uma motocicleta durante a madrugada com uma mochila nas costas e com atitude considerada suspeita pelos agentes de segurança. Após a busca, os policiais encontraram em sua mochila 72 porções de cocaína, 50 de maconha e uma balança digital.
A defesa do homem, preso em flagrante por tráfico de drogas, recorreu da condenação em primeira instância. Ao avaliar o caso, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) decidiu manter a condenação. Em novo recurso, a questão chegou ao Superior Tribunal de Justiça. O STJ, por outro lado, apontou que a busca pessoal foi irregular porque os policiais não descreveram precisamente o que havia motivado a suspeita. Como efeito, o tribunal de Brasília decidiu trancar o processo e considerou ilegítimas as provas coletadas na abordagem.
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Na reunião dos secretários de segurança pública, o Conselho também decidiu pela elaboração de um documento a ser encaminhado a todos os estados e ao DF reforçando a manutenção das abordagens – o texto está em etapa de finalização e o envio deve ocorrer até sexta-feira (10). A ideia é que os secretários utilizem dessas diretrizes para levar a discussão ao Judiciário e ao Ministério Público dos estados, além das próprias corporações de polícias, para afastar o risco de enfraquecimento da atuação preventiva das forças de segurança.
Para o secretário de segurança pública do Acre, coronel Paulo Cézar Rocha dos Santos, a decisão do STJ tem sido assunto constante em todas as corporações policiais do país e se trata de um “desestímulo à utilização de uma ferramenta que é premente à prevenção de delitos, sem a qual não há prevenção”.
Na avaliação do secretário de segurança pública da Bahia, Ricardo Mandarino, a consequência de a polícia deixar de fazer a abordagem de suspeitos é o comprometimento da segurança nos estados. “O que cabe à polícia é observar as regras do art. 5 da Constituição, respeitando os direitos e as garantias individuais, com abordagens educadas e sem abuso, tendo sempre em conta o respeito à dignidade da pessoa humana", afirma. O secretário reforça que a decisão do tribunal não tem efeito vinculante, o que não impede as polícias de fazer as abordagens.
Conforme explica o presidente do Consesp, a decisão dos secretários de reforçar a importância das abordagens policiais foi unânime na reunião, uma vez que se trata de um procedimento padrão da atuação das polícias preventivas. “Diante do que preconiza o Código de Processo Penal, não entendemos que haja abuso no sentido de que, existindo a fundada suspeita de que a pessoa esteja portando um objetivo ilícito ou esteja numa situação flagrancial, de forma preventiva deve haver a abordagem da polícia”, pontua Ferreira.
“O Conselho também foi unânime no sentido de que as polícias são preparadas para que essas abordagens não firam os direitos humanos. Havendo a necessidade da busca pessoal, ela deve continuar sim, porque é um procedimento previsto em lei”, destaca.
Para ele, limitar a atuação preventiva da polícia por meio das abordagens, ou até de mesmo causar insegurança no efetivo quanto à prática, traria consequências diversas à sociedade ao impedir a prevenção da conduta criminosa. Ferreira aponta ainda o aumento da circulação de drogas e armas como consequência de uma eventual redução nas abordagens.
“Sabemos que há regiões em que existe maior cometimento de crimes, em que criminosos andam armados, portam e traficam drogas. E o trabalho ordinário da polícia preventiva é este: havendo suspeita, ele tem que fazer a averiguação para ver se há o cometimento de crime, que pode ser porte ilegal de armas de fogo, porte de drogas, porte de arma branca ou objeto que possa ser usado para o cometimento de um crime”, explica o presidente do Consesp. “Esse trabalho é fundamental. Limitá-lo seria um grave risco à segurança pública”, ressalta.
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