“Em primeiro lugar, houve um enquadramento forçado em delitos contra a Segurança Nacional a fim de contornar o fato de que o Código de Processo Penal só ite as medidas cautelares mais severas a delitos graves. Em segundo lugar, houve a ficção de flagrante e um contorcionismo jurídico para enquadrá-lo inafiançável, visto que esse é o único caso em que cabe prisão em flagrante contra parlamentares”, afirma Uliano.
A Lei de Segurança Nacional acabou revogada em setembro do ano ado, mas as acusações contra Silveira foram mantidas. Na sentença proferida pelo STF, Silveira acabou condenado com base na lei 14.197, promulgada em 1 de setembro de 2021 em substituição à legislação da época da ditadura.
Um dia antes do julgamento de Silveira, Alexandre de Moraes negou seis pedidos feitos pela defesa do deputado. Além disso, Moraes classificou de má-fé as requisições do advogado de Silveira, Paulo Faria, e aplicou multas que chegam a R$ 10 mil reais. "Considerada a interposição de sucessivos recursos manifestamente inissíveis, improcedentes, ou meramente protelatórios, com objetivo de postergar o julgamento de mérito desta Ação Penal, fixo multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) em desfavor do advogado", diz em mais de uma das decisões.
Moraes negou pedidos de extinção da pena de Silveira, da possibilidade de o investigado dar entrevistas, de participar de eventos sociais e usar redes sociais. Em publicação no Twitter o advogado lembrou que a defesa do ex-presidente Lula chegou a enviar 400 recursos em uma ação. "O que os advogados do Lula têm que eu não tenho? Eles fizeram mais de 400 recursos, e não soube que tomaram qualquer multa. Alguém poderia explicar">Já no dia do julgamento, o advogado chegou a ser impedido de entrar por não apresentar o comprovante de vacinação contra Covid-19. Ele acabou liberado após fazer um teste rápido e comprovar estar sem a doença. Já o réu, Daniel Silveira, foi barrado do tribunal devido a uma resolução da corte que permite a entrada no plenário apenas de advogados, ministros e seus auxiliares e procurador-geral da República. Todo réu possui o direito constitucional de acompanhar o próprio julgamento, mas isso não foi aplicado ao caso de Silveira.
Outra ilegalidade patente no caso de Silveira é o fato de o STF ter assumido diferentes papeis ao mesmo tempo. A Corte foi responsável tanto pelo julgamento, com pela acusação de Silveira. E até por investigá-lo, se se levar em conta que o chamado inquérito das fake News, foi aberto pelo próprio STF em 2019 para investigar supostos ataques aos ministros, inclusive os vídeos de Silveira.
Além disso, os vídeos do deputado tinham como alvo direto os ministros e o próprio STF, tornando a Corte também a vítima dos supostos crimes. A separação entre essas instâncias, investigação, acusação e julgamento é necessária para que a sentença seja feita com base em fatos, sempre obedecendo o que diz a Constituição e o ordenamento jurídico, e impedindo que as sentenças acabem sendo instrumentos de vingança ou represália.
Em 1º de abril, a maioria dos ministros referendou a aplicação de multa diária de R$ 15 mil a Daniel Silveira, além do bloqueio de todas as suas conta bancárias, para forçá-lo a colocar a tornozeleira eletrônica. O parlamentar se recusava a instalar o equipamento para ser monitorado, por considerar que a medida afetava o exercício de seu mandato e, por isso, deveria ser autorizada pela maioria dos deputados federais, como ocorre em caso de prisão.
Para alguns dos principais penalistas do país, a Corte criou uma inovação, em matéria penal, não prevista na legislação. A medida também chamou a atenção dentro do Ministério Público que, até o momento, não via essa possibilidade. Procuradores ouvidos pela reportagem estranharam a decisão e consideram que esse precedente questionável poderá agora ser aplicado a qualquer pessoa.