Após o episódio de violência, alguns membros do grupo de agressores decidiram pichar um muro próximo ao colégio (veja imagem abaixo) com a seguinte mensagem “1º beck [gíria para maconha] após destruir uma transfóbica”.

Muro pichado por estudantes que participaram das agressões (Reprodução)

Familiares apontam omissão da direção da escola

Familiares das alunas agredidas relataram à Gazeta do Povo que houve negligência por parte da direção do colégio no tratamento do caso. O primeiro ponto citado foi quanto à orientação da pedagoga para que as próprias estudantes fizessem uma consulta aos colegas sobre um assunto delicado e isso sem o acompanhamento de um profissional da instituição.

“Como eles expõem duas adolescentes a fazer uma enquete sala por sala sobre um assunto tão delicado?”, questiona o pai de uma das vítimas. “O assunto em questão não era a orientação sexual do menino, era proteger as meninas no sentido de não abrir precedentes para que outros meninos usassem o banheiro feminino. A escola deveria se posicionar sobre como iria cuidar disso, para que a situação não saísse do controle, e houve má condução”, argumentou.

Para ele, há preocupação quanto à falta de controle no uso dos banheiros. “A preocupação vai da mais leve à mais pesada: a mais leve é que meninos estejam lá tentando olhar as meninas, mas há também o risco de gravarem as meninas no banheiro com o celular e exporem elas em redes sociais. E nosso receio mais grave, claro, é que um menino estupre uma menina dentro do colégio”, disse o pai.

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A forma como a direção da escola lidou com o episódio também foi questionada pelos pais. No dia seguinte ao ocorrido, a diretoria marcou uma reunião com os alunos envolvidos e seus responsáveis, mais a equipe de pedagogia e agentes da patrulha escolar. Segundo os familiares das vítimas, não houve espaço para que as alunas se manifestassem e não foram apontadas medidas práticas para a solução do caso, bem como penalizações aos agressores.

“Na reunião, a pedagoga tentou o tempo todo justificar que não pediu uma pesquisa, só queria saber quem não concordava com que o estudante entrasse no banheiro das meninas. O policial teve que interferir senão as meninas não conseguiriam dar a versão delas. Foram interrompidas pelos integrantes da direção várias vezes”, afirmou a mãe da outra vítima. Ela salientou que, diante da omissão da escola, sente insegurança de que a filha retorne às aulas. A família pediu medidas protetivas para a adolescente e avalia trocar a estudante de escola.

Os familiares da outra vítima afirmaram que irão processar membros da diretoria da escola. “Queremos deixar registrado que diante de um assunto tão sério como esse, e que poderia ter levado a consequências ainda mais sérias, eles sejam responsabilizados para que em a lidar com isso de forma diferente, debatam sobre o tema e tomem providências para que isso não volte a acontecer nem com a minha filha, nem com a filha de ninguém”, declarou.

Outro lado

A Gazeta do Povo entrou em contato com a direção da escola, que negou conversar com a reportagem e informou que a instituição reou os detalhes do ocorrido à Secretaria da Educação e do Esporte do Paraná (Seed-PR), que responderia aos questionamentos.

À reportagem, a Seed-PR encaminhou duas notas sobre o episódio, uma da própria Secretaria e a outra em nome do colégio.

Nota Seed-PR:

“Uma estudante, sem autorização da direção, fez uma pesquisa informal, perguntando aos demais alunos sua opinião a respeito do uso do banheiro por um aluno transexual. Essa teria sido a situação que desencadeou a briga nas proximidades da escola na última quinta-feira (7). Já na sexta-feira (8) os responsáveis dos estudantes foram chamados para uma conversa na escola, na presença do Conselho Tutelar.

A orientação da Secretaria de Estado da Educação e do Esporte (Seed-PR) em relação ao uso do banheiro por alunos transexuais é que a escola dialogue com a família. A partir do momento em que os responsáveis pelo aluno fazem o registro no Sistema Estadual de Registro Escolar (Sere) indicando sua identidade de gênero, o estudante a a utilizar o banheiro correspondente”.

Nota Instituto de Educação Estadual de Maringá:

Na nota do colégio (veja a íntegra no final da reportagem), a instituição diz que repudia a violência dentro ou fora da nossa escola e afirma que o episódio de violência já foi resolvido. “Seguindo o protocolo da Seed (Secretaria de Estado da Educação e do Esporte), apuramos os fatos, convocamos as pessoas envolvidas, inclusive pais e responsáveis, e tomamos as medidas cabíveis para a resolução do problema tanto na esfera policial quanto na pedagógica”.

A reportagem contatou o Conselho Tutelar de Maringá e questionou quais foram as medidas empregadas pelo órgão em relação ao caso. Não houve retorno até o fechamento desta reportagem.

Após caso em Maringá, deputado paranaense apresenta projeto de lei sobre uso de banheiro nas escolas

Nesta terça-feira (12), o deputado estadual Homero Marchese (Republicanos) apresentou um projeto de lei na Assembleia Legislativa do Paraná que determina o uso de banheiros nas instituições de ensino do estado de acordo com o sexo biológico dos seus usuários. A proposta prevê que caso algum estudante se oponha ao uso do banheiro destinado ao seu sexo biológico, a instituição deverá disponibilizar um sanitário de uso individual para alunos de qualquer sexo.

“Diante da complexidade do assunto e da impossibilidade de agradar todo mundo, a verdade é que a sociedade está fugindo de tentar resolvê-lo. Esse assunto também tem sido mal orientado, no meu ponto de vista, por núcleos de educação”, disse o parlamentar.

“O principal problema nesse assunto tem a ver com o uso do banheiro feminino por meninos ou homens. Acredito que a maior parte das meninas e das mulheres e também dos seus familiares não gostaria que isso acontecesse, e é razoável que entendam desse jeito. Acredito que [o projeto de lei] é uma solução de compromisso que trata a todos com dignidade, supre uma omissão importante e dá uma solução para o caso”, afirmou o deputado.

Marchese também enviou ofício à Secretaria de Educação e Esporte do Paraná, bem como ao Ministério Público, ao Conselho Tutelar e à Polícia Civil do Paraná pedindo esclarecimentos sobre quais providências serão tomadas em relação ao caso de agressão no colégio maringaense.

Veja abaixo a nota, na íntegra, do Instituto de Educação Estadual de Maringá:

“A direção do Instituto de Educação Estadual de Maringá vem a público, por meio desta nota, manifestar seu total repúdio a todo e qualquer tipo de violência, seja dentro ou fora da nossa escola. Esta direção não compactua nem se omite diante de qualquer ato que coloque em risco a integridade física e emocional dos nossos professores, funcionários e estudantes.

Guiada por esses princípios, a direção informa que o caso de violência ocorrido no dia 07 de julho, no entorno da escola, envolvendo alunos(as) e ex alunos(as) do IEEM, foi resolvido. Seguindo o protocolo da Seed (Secretaria de Estado da Educação e do Esporte), apuramos os fatos, convocamos as pessoas envolvidas, inclusive pais e responsáveis, e tomamos as medidas cabíveis para a resolução do problema tanto na esfera policial quanto na pedagógica.

A escola não pode resolver todos os problemas da sociedade. Não é seu papel nem sua função. O papel da escola, desafiador por natureza, é formar cidadãos e cidadãs capazes de conviver em sociedade e construir seu futuro com autonomia e respeito às outras pessoas. É na escola que as diferenças se encontram e aprendem a conviver. As nossas instituições de ensino não fazem distinção de pessoa — a sociedade inteira se encontra na escola. Por isso, nosso instituto preza tanto pela paz e pela boa convivência. É só assim que o processo de ensino e aprendizagem, inclusive de valores, pode acontecer.

Cabe destacar que o Instituto de Educação Estadual de Maringá reafirma seu posicionamento por uma educação de qualidade baseada no respeito mútuo como princípio indelével. Estamos construindo uma escola mais humana e acolhedora para todas e todos.

Por fim, mas não menos importante, lamentamos a publicidade dada não apenas a esse caso como a outros incidentes ocorridos em outros colégios do estado. Hoje, é a nossa escola. Ontem, foi outro colégio. Amanhã, será outra instituição. A espetacularização dos conflitos nas instituições de ensino é prejudicial para a comunidade inteira. Reforça estigmas, prejudica o diálogo e atrapalha o duro trabalho pedagógico. A escola já tem desafios de mais para lidar também com esse”.

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