Que argumentos você usa a favor da divulgação da abstinência como um dos métodos preventivos contra gravidez na adolescência?
Nelson Júnior: A sociedade precisa saber primeiro que a iniciativa da ministra é constitucional, não fere os direitos individuais como andaram dizendo. Pelo contrário, ela atende ao que está escrito no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O artigo 86 fala da política de atendimento ao adolescente e chama a participação da sociedade civil; o artigo 87 inciso III cita a criação de serviços especiais de prevenção e o artigo 88 trata da política de atendimento. Não há nada que fira o Estado Laico ou a Constituição. A segunda etapa é entender o que é ser adolescente no Brasil.
"Segundo o ECA, a adolescência compreende a faixa etária dos 12 aos 18 anos, sendo que a relação sexual com menores de 14 anos é estupro de vulnerável (Código Penal, artigo 118). Isso já foi discutido e confirmado inclusive no STF. Acontece que ele entra na adolescência aos 12 anos, então dos 12 aos 14 esse público precisa receber uma orientação que não estimule o sexo, porque para o Estado e para a Constituição, relação sexual nessa idade é crime. Dos 12 aos 14 anos, o adolescente tem que esperar. Ele tem que ser estimulado a pensar que não é o momento para isso. Esse é o primeiro governo que inclui como política pública a abstinência sexual. O que sempre aconteceu é o que nós chamamos de exclusão reversa. É você excluir um tema da maioria."
Como você viu a repercussão negativa em torno da proposta da ministra Damares Alves?
Nelson Júnior: Eu realmente me espanto com o preconceito com o tema, já que há demanda para isso. A abstinência sexual é importante nessa faixa etária. Aí a imprensa me pergunta o que que eu acho daquela cartilha que o presidente mandou cortar. Todo e qualquer material que estimule a relação sexual nessa idade abaixo de 14 anos é crime. Já estamos organizando também uma comissão jurídica para que comecemos a fazer voz para os casos, como o de uma professora da minha cidade (Vila Velha-ES) que ou como dever de casa para crianças de 11 anos uma pesquisa sobre sexo oral. É crime. Os educadores que começarem a insistir com esse tipo de material inadequado para a idade precisam ser questionados judicialmente. A mãe pegou a filha de 10 anos pesquisando no Google sobre sexo oral porque a professora tinha pedido. A gente não pode ficar calado.
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Essa pauta não é de uma religião. Essa pauta vem ao encontro do anseio da grande maioria dos brasileiros. Quando um caso desses acontece, quem reage é a sociedade como um todo. Eu tenho sido abordado fora dos templos. O Instituto Eu Escolhi Esperar vai fazer frente, dar voz para fortalecer a iniciativa pública. Vai somar. Eles não estão criando algo para nos atender. Nós vamos comprar essa briga de por a nossa cara na rua, de ir pro debate, porque esse tema tem que envolver a família.
Qual é a primeira campanha que o Instituto pretende fazer?
Nelson Júnior: Já tem nome: "Esperar Também É Uma Escolha". Vamos dialogar com a sociedade em audiências públicas para mostrar que essa pauta não é religiosa. Esse tema é da família. Temos estudos, relatórios e comprovações científicas para provar que é preciso fazer esse diálogo. O 13.° Anuário de Brasileiro de Segurança Pública do Ministério da Justiça, que é um relatório sobre violência no Brasil, informou em 2018 que o Brasil tem 4 meninas de até 13 anos estupradas por hora. A Sociedade Brasileira de Pediatria diz que nos últimos 20 anos 13 milhões de adolescentes engravidaram no Brasil e que a gravidez precoce é responsável por 20% das mortes de adolescentes do sexo feminino. Segundo a Organização Mundial de Saúde, o Brasil lidera o ranking de gravidez de adolescentes na América Latina. Já os principais órgãos de saúde dos EUA concordam que a abstinência sexual, somada a métodos contraceptivos, proporciona os melhores resultados com adolescentes.
Pretendemos fazer a primeira audiência pública na Assembleia Legislativa do Espírito Santo e estamos conversando também com vereadores da Câmara Municipal de São Paulo, com alguns deputados federais e até senadores para termos debates lá em Brasília com os parlamentares.
O que defende o Instituto Eu Escolhi Esperar?
Nelson Júnior: O Instituto Eu Escolhi Esperar defende a educação sexual abrangente e eu vibrei quando a ministra disse que as outras políticas públicas serão mantidas, porque isso desmonta o argumento de que não há comprovação científica de que ensinar abstinência sexual funciona. Isso é prevenção primária! E somada à prevenção secundária, à distribuição de camisinhas e pílulas, é justamente o que funciona. Os EUA hoje têm um dos menores índices de gravidez na adolescência no mundo. Em 30 anos caiu 70% o índice por causa da educação sexual abrangente, que fala também de abstinência sexual, aliada a outros métodos contraceptivos. Só que lá nos EUA o governo federal só financia as campanhas de abstinência sexual. Esse é o pulo do gato. Nos países que só trabalham com os outros métodos, sem falar de abstinência sexual, como no Brasil, não funciona. Nós estamos na era da informação, não tem como negar a informação. Vamos dar a informação de maneira responsável.
Qual é a estratégia para convencer os adolescentes a adiar a iniciação sexual?
Nelson Júnior: A estratégia é a do pertencimento. O adolescente quer pertencer a determinado grupo. Hoje eles têm vergonha de assumir que são virgens, porque sofrem bullying, são zoados. Eu começo falando para eles que eu já fui adolescente, também tive vergonha. Eu conto para eles que uma vez num grupo de colegas na escola eu menti, porque todos diziam que não eram mais virgens e eu disse também. Quem me garante que eles, como eu, não estavam mentindo? Nossa experiência nesses últimos dez anos tem mostrado que quando começamos a dizer que esperar também é uma escolha, que está tudo bem, os adolescentes se identificam. De 2012 a 2016, nos encontros ainda nas igrejas, distribuímos pulseirinhas do Movimento Eu Escolhi Esperar. Aquilo virou uma febre, porque eles sentiam “Ah, enfim, encontrei um grupo que me entende”. Quando eles percebem que pessoas pensam como eles é um alívio, se sentem à vontade.
Como é a conversa sobre sexo com os adolescentes?
Nelson Júnior: Eles querem ouvir. Os pais ficam constrangidos de falar (sobre sexo) e, às vezes, quando am a informação, am errado. Eu falo abertamente que não é vergonha ser virgem e que adiar o início da vida sexual é uma escolha deles, que ninguém precisa ceder às pressões culturais para se sentir aceito pelos amigos. Conto minha história pessoal.
Qual é seu objetivo?
Nosso desejo, como instituto, é influenciar, positivamente, uma mudança na cultura do sexo pra crianças e adolescentes no Brasil. A sociedade brasileira anseia por isso há anos. Tudo é erotizado, tudo é sexualizado. A erotização incomoda os pais. Leva tempo pra colher resultados, é como plantar tamareira. Nosso planejamento é para dez ou vinte anos, mas acreditamos que é possível mudar, influenciando através dos valores.