Segundo uma pesquisa do Media Research Center realizada em novembro de 2020, 45% dos eleitores de Biden entrevistados em sete swing states (Arizona, Carolina do Norte, Geórgia, Michigan, Nevada, Pensilvânia e Wisconsin – todos eles vencidos por Biden, com exceção da Carolina do Norte) não tiveram conhecimento da denúncia e 9,4% teriam deixado de votar no democrata se soubessem do caso. De acordo com o MRC, ainda que esses eleitores não votassem em Trump (eles poderiam escolher um terceiro candidato ou simplesmente deixado de votar), o mero fato de não escolherem Biden teria bastado para que o republicano vencesse todos esses sete estados e conseguisse a reeleição. Quem tenta minimizar os dados da pesquisa ou os efeitos da censura do Twitter alega que em nenhum momento a reportagem saiu do ar no site do jornal nova-iorquino, mas, diante da tendência mundial cada vez maior de se usar as mídias sociais como fonte primária de informação, não há como negar que a supressão de uma história no Twitter limita fortemente o seu potencial de difusão.
O resultado da eleição teria sido diferente? Impossível dizer com certeza, mesmo com os dados do MRC. Mas a manipulação com intenção eleitoral foi real. E por isso é surpreendente que os Twitter Files não estejam recebendo a devida atenção da imprensa norte-americana e internacional. Se o oposto houvesse ocorrido – uma filtragem de conteúdo que deliberadamente beneficiasse Donald Trump –, o tema estaria constantemente nas manchetes dos principais jornais e a lisura do processo eleitoral de 2020 seria amplamente questionada devido à ação de um ente privado com imensa força midiática favorecendo um dos candidatos. Mas nada disso ocorreu até o momento; assim como o Twitter fez suas escolhas ao sufocar certos assuntos ou pessoas, a imprensa mainstream o faz agora ao sufocar os Twitter Files. E isso nos traz a um aspecto legal fundamental, que vale tanto para os Estados Unidos quanto para o Brasil.
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Jornais e outras empresas de comunicação têm o direito legal de escolher o que desejam ou não publicar, pois são o que se chama de “editores” ou “publishers”. Justamente por isso podem responder na Justiça pelo conteúdo que publicam. As mídias sociais, como Twitter, Facebook, Instagram e YouTube, não estão sujeitas a tal responsabilização segundo a Lei de Decência das Comunicações norte-americana e o Marco Civil da Internet brasileiro, mas apenas porque elas são classificadas como “plataformas”, ou seja, meros intermediários que, teoricamente, não interferem naquilo que é publicado, desde que não constitua crime; ao menos no Brasil, as mídias sociais só se tornam corresponsáveis quando descumprirem ordens judiciais para a remoção de conteúdo evidentemente criminoso. O que os Twitter Files comprovam é que o Twitter se comporta na prática como editor, mas escapa das obrigações legais advindas desse status ao se descrever como plataforma.
Seja pelo uso oculto de filtros com viés ideológico, como fazem as Big Techs, seja pela imposição do braço estatal, como fazem os tribunais superiores brasileiros, quem perde é a liberdade de expressão, sufocada tanto por quem teria a obrigação constitucional de defendê-la quanto por quem gerencia as ferramentas que nasceram como uma oportunidade inédita de permitir a qualquer pessoa manifestar sua opinião. Já que está cada vez mais difícil que os nossos supremos se emendem, que ao menos as Big Techs tenham de fazê-lo: o escândalo dos Twitter Files precisa ser um ponto de partida para que a legislação seja atualizada, fechando as possibilidades de uma mídia social seguir burlando a lei ao se apresentar como plataforma e agir como editora. Ou tais empresas am a respeitar verdadeiramente a liberdade de expressão, sem censuras político-ideológicas; ou tornam seus critérios transparentes, submetendo-os ao seu público, e am a responder pelas escolhas que fazem.