São justamente os moradores das favelas dominadas pelo tráfico as maiores vítimas deste estado de coisas. As comunidades densamente povoadas são um esconderijo conveniente para as facções criminosas, pois são celeiro fértil de vítimas inocentes da troca de tiros entre policiais e bandidos. E o medo impede qualquer reação ou denúncia da população pobre, a maioria que deseja apenas trabalhar honestamente e viver em paz. Que pai de família se sente confortável em ver um filho ser aliciado por traficantes? Mas que pai de família terá coragem para se levantar contra os aliciadores, se isso representar morte certa? É ilusório acreditar que as facções criminosas ou milícias que dominam os morros cariocas sejam estimadas pelos demais moradores; o silêncio e a conivência são mero fruto do temor. a474r

O poder de fogo adquirido pelas facções criminosas e milícias cariocas encasteladas nos morros transforma qualquer operação policial em verdadeira ação de guerra, e o fato de tais operações se desenvolverem em áreas hiperpopulosas cria as condições para a catástrofe que também vitima inocentes. Ninguém nega a necessidade de melhor treinamento, equipamento e até remuneração para os policiais; ninguém exclui a possibilidade de excessos cometidos por forças de segurança mal treinadas. Mas, independentemente das circunstâncias concretas dos acontecimentos de Jacarezinho, ignorar o reino de terror instaurado pelo crime nas comunidades cariocas é, na mais benigna das hipóteses, uma demonstração de ingenuidade que apenas atrapalha o bom e necessário combate à criminalidade.