Somadas, as três grandes alianças de partidos nacionalistas e eurocéticos elegeram 128 eurodeputados em um total de 751, tornando-se a terceira força dentro do Parlamento Europeu – ou a segunda, se também forem considerados políticos do mesmo perfil espalhados por outros grupos. Essas alianças não deverão integrar a coalizão majoritária, já que bastaria aos dois maiores blocos pró-europeus se unirem aos Verdes para manter a maioria dentro da casa legislativa, mas ganharam força para que seus pleitos sejam ao menos considerados.
O fenômeno do populismo e do euroceticismo, ao contrário do que um retrato precipitado mostra, não é movido por um ódio puro e simples aos imigrantes que, mais recentemente, têm buscado refúgio na Europa, escapando de infernos como a Líbia, a Síria e o Iêmen. O racismo e a xenofobia são reais, mas o que está por trás de boa parte da resistência ao projeto europeu é uma sensação mais ampla, de que o ideal que guiou personalidades como Robert Schuman, Alcide de Gasperi e Konrad Adenauer se perdeu. A ideia original deles e de outros líderes era a de uma cooperação europeia alargada, para superar as divisões que haviam levado o continente a duas grandes guerras em menos de 50 anos; uma cooperação baseada principalmente na subsidiariedade – presente, por exemplo, no Tratado de Maastricht, de 1992, que estabeleceu a UE em substituição à Comunidade Econômica Europeia – e no respeito às autonomias nacionais.
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O que tem ocorrido, no entanto, é um movimento de hipercentralização, em que poderes antes delegados aos países-membros são paulatinamente deslocados para a istração central da UE em Bruxelas. Ali, uma burocracia nem sempre eleita pelos cidadãos europeus tem incrementado regulações que, muitas vezes, ignoram realidades locais e sufocam especialmente pequenos empresários e produtores agrícolas. Além disso, essa mesma burocracia, em nome de convicções multiculturalistas, também tem procurado impor valores estranhos ao ethos de vários dos países-membros. A questão migratória, por esse prisma, é apenas a gota d’água que despertou uma reação daqueles para quem Bruxelas estava indo longe demais, especialmente quando se trata de grupos que recusam a assimilação em sua nova casa.
Como os partidos nacionalistas e eurocéticos usarão o prestígio conquistado recentemente ainda é uma incógnita. Se preferirem a retórica explosiva e as estratégias de terra arrasada, eles podem implodir o projeto europeu por dentro, com consequências imprevisíveis, a exemplo do que já vem ocorrendo com o Brexit. Ou podem trabalhar para aperfeiçoar este mesmo projeto, devolvendo-o às suas origens, de colaboração entre os membros com respeito às autonomias e culturas de cada nação, restringindo ímpetos hiper-regulatórios e multiculturalistas, um cenário em que o continente só tem a ganhar.