Uma possibilidade vem sendo explorada pelo Ministério Público Federal, como explicamos neste espaço: o órgão está se recusando a apresentar denúncia nos casos em que Moraes fatiou o inquérito e remeteu determinados casos à Polícia Federal nos estados. Os procuradores têm alegado “vício de origem” para pedir o arquivamento das investigações, sendo atendidos pelos juízes de primeira instância. Esta é uma avaliação de cunho puramente jurídico, sem nenhuma paixão política ou ideológica, e que apenas ressalta a fragilidade do inquérito do ponto de vista processual. Uma atitude que poderá ser repetida em Brasília: naquilo que permanecer dentro do âmbito do STF, caberia à Procuradoria-Geral da República oferecer eventuais denúncias, e o órgão tem toda a liberdade e autonomia para não fazê-lo.

Além disso, o ordenamento jurídico brasileiro ainda garante uma série de possibilidades a quem considera o inquérito das fake news ilegal e abusivo, e se sente prejudicado por ele. É dentro deste marco que o governo vem se movimentando até o momento, como na decisão de pedir habeas corpus preventivo para o ministro da Educação, Abraham Weintraub, que tinha sido intimado por Moraes a prestar esclarecimentos sobre uma frase dita durante a reunião ministerial de 22 de abril – o depoimento acabou ocorrendo na tarde desta sexta-feira, e o ministro permaneceu calado o tempo todo. Além disso, nada impede que ministros do Supremo sejam acionados dentro da Lei de Abuso de Autoridade; o próprio Bolsonaro considera que Celso de Mello, ao mandar divulgar a íntegra da reunião, e não apenas os trechos referentes ao ministro Sergio Moro e à Polícia Federal, teria desrespeitado trechos da lei.

Existem suficientes remédios dentro do marco institucional brasileiro para conflitos como os atuais

O que não se pode itir é o flerte com a ruptura institucional disfarçada de recurso ao famoso artigo 142 da Constituição, o da “intervenção militar”. Não cabe às Forças Armadas agir como moderadora entre poderes em conflito, como se fossem elas mesmas um quarto poder, dito Moderador. Esta função foi extinta com a primeira Constituição republicana, e parece-nos evidentemente impensável que o constituinte de 1988 quisesse dar esse papel aos militares em um país que acabava de sair de uma ditadura militar. Este é terreno perigosíssimo do qual o presidente se aproxima irresponsavelmente quando, por exemplo, compartilha um vídeo sobre o assunto.

Isso não significa que o STF seja o único poder da República que não está sujeito ao sistema de freios e contrapesos, por mais que, em alguns momentos, pareça agir sem limite algum. No ordenamento brasileiro, é o Senado que exerce esse papel, quando por exemplo tem a prerrogativa, descrita no artigo 52 da Constituição, de analisar pedidos de impeachment de ministros do Supremo – ministros esses, aliás, cuja nomeação foi aprovada justamente pelo Senado.

Existem, portanto, suficientes remédios dentro do marco institucional brasileiro para conflitos como os atuais, e crises semelhantes já foram resolvidas no ado sem o recurso à ruptura. Mas foi necessário muito bom senso e equilíbrio da parte de todos os envolvidos. Que também desta vez cada ator tenha consciência de sua responsabilidade; o objetivo não é acalmar ânimos para meramente transformar um conflito aberto em guerra fria, mas o de atingir uma autêntica pacificação fazendo a lei prevalecer acima de quaisquer convicções e interesses pessoais.

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