Não é preciso ir além desses aspectos para concluir que a inflação é um mal, sobretudo porque o nível geral de rendas (salários, aluguéis, juros e lucros) não varia ao mesmo tempo e nos mesmos porcentuais da variação do nível geral de preços. Além disso, a inflação distorce a função dos preços como medida de valor, desorganiza o sistema de cálculo de preços, distorce os orçamentos como instrumento de planejamento, corrói o valor dos ativos (investimentos financeiros, imóveis, ações e outros) possuídos por pessoas, empresas e outras instituições, prejudica o funcionamento do mercado e acaba jogando a economia em recessão. Em síntese, a inflação empobrece a nação e prejudica mais fortemente as camadas de renda mais baixa.
Na campanha eleitoral de 2022, Lula declarou que não fazia sentido praticar austeridade fiscal e equilíbrio das contas públicas enquanto houvesse pobres no país. Essa declaração é uma falácia, pois uma das principais causas da inflação é justamente o déficit público. Lula jogava para a plateia na tentativa de conquistar votos entre os pobres, sem ter de explicar as consequências de estourar os gastos públicos, criar déficits fiscais e aumentar a dívida do governo. A história já provou que entre as consequências dos déficits e da dívida estão a inflação e a elevação da taxa juros, dois venenos para a vida financeira dos pobres.
Na sequência desse ciclo, a inflação faz diminuir o consumo, os investimentos e a produção nacional, provocando o mais perverso efeito para os trabalhadores: o desemprego. Claro que Lula queria insinuar que os gastos públicos acima das receitas tributárias seriam a favor dos pobres, o que não é verdade. Ao vencer a eleição para seu terceiro mandato como presidente da República, a primeira medida de Lula foi, antes de assumir, criar enormes fontes de gastos públicos que começaram o ano batendo direto no aumento das despesas burocráticas do governo, como a criação de ministérios (quase duplicando o total de pastas no governo federal), novos órgãos, cargos e despesas decorrentes.
Se o governo cria despesas novas numa fase em que a economia está explodindo em crescimento, com expressivas taxas de aumento do Produto Interno Bruto (PIB), elevação do nível de emprego e aumento da arrecadação tributária, os efeitos nocivos são amenizados. Mas não é o que está acontecendo atualmente na economia global e no Brasil. De saída, está havendo uma conjunção de três problemas que, juntos, puxam o PIB para baixo e reduzem a possibilidade da elevação real dos impostos: trata-se de problemas internacionais que trazem o mercado mundial para baixo, de um lado, e certa retração na economia nacional em decorrência de perdas nas safras agrícolas, redução dos investimentos no país por investidores nacionais e estrangeiros, e retração no comércio varejista verificado pelo fechamento de lojas de grandes empresas do setor.
Se o aumento de despesas governamentais for pago com emissão de títulos públicos, isto é, aumento da dívida do governo, diminuirão os recursos disponíveis nos bancos para financiar o setor privado (considerando que o total de recursos disponíveis nos bancos é limitado pelo tamanho da economia nacional) e a primeira consequência é elevação da taxa de juros. Se, para cobrir seu déficit, o governo cair na tentação de emitir moeda acima da taxa de crescimento do PIB, entra a lei da oferta e procura aplicada ao mercado de dinheiro: mais moeda lançada no mercado por meio de fabricação de dinheiro resulta em queda no valor da moeda, ou seja, inflação.
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Os bancos centrais das maiores economias do mundo têm confirmado que suas políticas e medidas vinculam-se aos três objetivos perseguidos por sua atuação: crescimento do PIB, geração de emprego e controle da inflação. A questão é que, se a busca desses objetivos tornar-se obsessão e forem adotadas políticas arriscadas, o mundo pode acabar tendo a inflação sem conseguir a produção e o emprego. Quanto aos problemas internacionais, vale registrar o risco de queda acentuada na demanda global, como consequência da guerra entre Rússia e Ucrânia e a desaceleração da economia chinesa.
Vale registrar que a China está diante de desafios difíceis de vencer, como a crise imobiliária e a grave situação do sistema de previdência, que está em franca deterioração pela falta de recursos a fim de bancar o número crescente de aposentados, estimado em 300 milhões de pessoas que devem ir para a aposentadoria na próxima década. Como a economia chinesa é grande demais, em face de sua população equivalente a 17% da população mundial, o ritmo chinês afeta fortemente a economia mundial e a economia brasileira, já que a China é um dos principais parceiros comerciais do Brasil.
Caso ocorra elevação da inflação global ao lado de eventual desaceleração da demanda, haverá efeitos pesados sobre o Brasil nas três variáveis já citadas: crescimento do PIB, emprego e inflação. Se ao cenário internacional for juntada a política deliberada de elevar gastos públicos e fazer déficits, como disse Lula, os próximos anos confirmarão a profecia de que o Brasil terá mais uma década perdida na pretensão de caminhar rumo ao clube dos países desenvolvidos. Se, ao lado da política de déficits, o governo insistir na tentação de aumentar mais e mais a carga tributária – conforme o ministro Fernando Haddad ameaça o tempo todo –, não será surpresa se o país colher, também, mais uma recessão econômica em curto prazo. Esses são os riscos de imprudente gestão macroeconômica.