E o fato é este: a lista tríplice para a escolha do procurador-geral é um costume, não algo previsto legalmente (ao contrário, por exemplo, da escolha de reitores de universidades federais, em que o presidente é obrigado por lei a selecionar um dos integrantes das listas enviadas pela comunidade acadêmica). Os únicos requisitos são os constitucionais: idade mínima e pertencimento aos quadros do Ministério Público Federal. Pode-se até entender a lista da ANPR como uma recomendação, vinda dos próprios integrantes do MPF, que levam ao conhecimento do presidente da República os nomes daqueles que consideram mais adequados para chefiá-los, mas não como uma imposição que, no fim das contas, amarraria as mãos do chefe do Executivo e o submeteria a uma decisão corporativista.
Pretender impor goela abaixo do presidente da República a obrigação de escolher um integrante da lista alegando transparência ou a autonomia do Ministério Público é ignorar que o problema brasileiro não está nos métodos de escolha, mas nas pessoas que participam desse processo. Augusto Aras foi uma escolha ruim não porque não constasse da lista tríplice, mas porque, antes mesmo de ser escolhido, já dava indícios de que não era a melhor pessoa para conduzir o MPF, com suas críticas à Lava Jato e posições bem distantes daquelas do eleitorado de Bolsonaro – posições essas que ele foi amenizando apenas quando se tornou cotado para a PGR. Uma vez escolhido, deixou como grande legado justamente o fim da Lava Jato, com a dissolução da força-tarefa constituída em 2014; o apoio (revertido tardiamente) aos inquéritos abusivos do Supremo; e uma subserviência ao Planalto que ficou longe da missão institucional do MPF de defesa dos interesses da sociedade.
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Assim como na escolha de ministros do Supremo, é salutar que sejam os representantes eleitos pelo povo – o presidente da República, que faz a indicação; e os senadores, que a avaliam e podem aprová-la ou recusá-la – a selecionar livremente, entre os que cumprem as exigências legais, aqueles que consideram dignos do cargo de procurador-geral da República, sem imposições externas. Se temos preocupação genuína com tais nomeações, que saibamos eleger para o Planalto e para o Senado pessoas que comprovadamente tenham bons critérios e escolham sabiamente os ocupantes desses cargos.
É aqui que mora o perigo quando se trata de Lula neste seu terceiro mandato. Durante seu primeiro período no Planalto, dois procuradores-gerais por ele escolhidos – Antônio Fernando de Souza e Roberto Gurgel, ambos oriundos da lista tríplice da ANPR – conduziram bem a denúncia do mensalão no STF, que resultou na condenação e prisão de uma série de chefões petistas como José Dirceu e José Genoino, e a memória deste processo pode guiar a próxima escolha para a PGR. Se Lula, em vez de repetir boas nomeações como as de Souza e Gurgel, quiser um procurador-geral camarada, um Aras para chamar de seu, esteja ele ou não na lista tríplice, que o Senado tenha a coragem de fazer o que jamais fez antes: rejeitar uma indicação presidencial para o posto.