Aqui surge um problema: a inflação atual é obtida a partir dos índices ados já conhecidos – de onde também saem as projeções de inflação futura –, enquanto a taxa Selic fixada pelo Copom é paga em grande parte das operações de crédito e investimentos financeiros a partir da entrada em vigor da nova Selic. Por isso, a Selic é definida pelo Copom mediante projeções da inflação de longo prazo, em cujos cálculos entram as expectativas sobre o orçamento fiscal do governo. Uma das explicações do BC para a manutenção da taxa Selic nos 13,75% ao ano é que não são boas as projeções de déficits fiscais derivados do excesso de gastos públicos feitos justamente pelos governantes que criticam a taxa de juros.

O governo Lula, desde que foi eleito, vem se colocando contra o controle nos gastos do governo, como ficou claro com a extinção da lei do teto de gastos aprovada no governo Temer. Lula insiste que o governo pode fazer déficit público enquanto houver pobres, sem deixar claro que o atraso econômico, que prejudica os pobres, tem como uma de suas principais causas exatamente o descontrole das contas públicas. Essa situação não é nova para Lula, pois ele foi protagonista do mesmo problema em seus dois últimos anos de governo, 2009 e 2010, quando a gastança levou o governo a ter déficits que vinham empurrando a inflação para cima. O aumento da gastança nos dois últimos anos do governo Lula contribuiu para pôr fogo na inflação; os índices de preços aumentaram e o problema foi jogado no colo de Dilma.

Lula e o PT, dentro do espírito do esquerdista autoritário, não se conformam que a diretoria do BC tenha mandato fixo e autonomia para cumprir as funções do banco sem o risco de demissão a qualquer hora por mera vontade do presidente da República

Por ironia, o ministro da Fazenda de Dilma, o economista Guido Mantega, se viu na difícil tarefa de explicar a inflação e os déficits públicos para a presidente e discutir eventuais cortes nos gastos, quando era ele próprio o ministro da Fazenda de Lula na fase do estouro nos gastos do governo. Na época, para tirar de si a responsabilidade pelo problema, Mantega tentou convencer a presidente de que a inflação era resultado da elevação dos preços internacionais das commodities; logo, a causa estaria fora do Brasil. Naquela época, coube ao presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, convencer a presidente de que o aumento da inflação não era efeito dos preços das commodities, mas resultava do aumento na demanda interna em função dos gastos excessivos do governo e do consumo das famílias, movido a facilidades para compras a crédito.

Tombini tentava convencer Dilma Rousseff que cortes orçamentários eram necessários, sobretudo para amenizar a pressão sobre o aumento dos juros e evitar a inflação. O presidente do BC teve êxito em sua análise e na proposta de cortes no orçamento de gastos do governo federal, o que acabou sendo feito, embora com alguma timidez, pois seria ruim para a presidente começar seu mandato com piora da inflação, inibição do crescimento econômico e sacrifício dos mais pobres.

A história se repete agora, com a diferença de que Lula não pode demitir o presidente do BC em uma canetada, pois a lei de autonomia do BC fixou mandatos para os diretores do BC, e o de Roberto Campos Neto vai até o fim de 2024. Na essência, Lula e o PT, dentro do espírito do esquerdista autoritário, não se conformam que a diretoria do BC tenha mandato fixo e autonomia para cumprir as funções do banco sem o risco de demissão a qualquer hora por mera vontade do presidente da República. Em resumo: Lula não se conforma em não ter poder total e ilimitado de demitir o presidente e os diretores da instituição.