O Banco Central do Brasil (Bacen) tem utilizado a resposta mais comum à escalada nos preços: o aumento da taxa básica de juros da economia, a Selic. Nesse caso, pressupõe que as pessoas desejam comprar mais produtos do que está disponível na economia, um excesso de demanda. A Selic é basicamente a taxa de juros com a qual o governo pega dinheiro emprestado. Como o governo é o maior agente da economia e geralmente paga suas contas em dia, essa taxa se torna um parâmetro para todas as outras taxas de juros da economia.

O mecanismo por detrás dessa política é relativamente simples. Inicialmente, o Bacen anuncia que vai aumentar os juros, e, com isso, ocorre um aumento geral nas outras taxas de juros da economia. Como resultado, fica mais atrativo manter o dinheiro no banco ao invés de gastar, e mais caro pegar dinheiro emprestado nos bancos. Consequentemente, menos dinheiro é injetado na economia, menos produtos são vendidos. Com estoques cada vez maiores, a expectativa é que os vendedores abaixarão os preços, reduzindo a inflação.

Mas, o que acontece se os estoques dos vendedores não aumentarem? E se a fonte da inflação não for um excesso de demanda? Talvez o Bacen devesse repensar essas questões antes de aplicar novos aumentos de juros. Na prática, observa-se em vários setores uma escassez de insumos, causada principalmente pelos períodos de lockdown por conta da Covid-19. Com isso, os vendedores têm produzido menos e cobrado mais caro pelos produtos. Nesse caso, é difícil imaginar que o aumento da Selic levará ao aumento dos estoques.

Alternativamente, grande parte dos produtos, apesar de feitos no Brasil, são precificados internacionalmente. Por exemplo, o óleo de soja pode ser vendido tanto no Brasil quanto na China, portanto, os preços nos dois países devem estar alinhados. Adicionalmente, ao longo da pandemia, o Real foi uma das moedas que mais se desvalorizou. Como efeito, os produtos importados ficaram mais caros, assim como aqueles produtos que o Brasil produz e podem ser vendidos para outros países. Esse efeito câmbio pesa diretamente no bolso do consumidor ao comprar o produto final e, indiretamente, no custo do produtor, tornando o preço dos produtos finais mais salgados.

Somando os dois efeitos, não teríamos necessariamente uma inflação causada por excesso de demanda, mas, principalmente, pela desvalorização cambial e pela falta de insumos. Nesse caso, possivelmente, o Bacen está usando um remédio que não “ataca o foco da doença”. No máximo, o incremento da Selic pode aumentar a demanda pela moeda brasileira e valorizar o câmbio, afetando indiretamente o preço dos produtos importados.

Outro efeito indireto da elevação dos juros é a perda de dinamismo da atividade econômica, isto é, talvez o remédio pode estar matando o paciente, que seria a economia brasileira. E pior, o trabalhador assalariado, geralmente é o mais afetado, afinal, como manter as contas em dia quando o salário aumenta uma vez por ano - quando aumenta - enquanto os preços crescem a cada ida ao mercado? Não é à toa que a inflação é denominada "o imposto sobre os mais pobres".

Guilherme Marques Moura, doutor em Desenvolvimento Econômico, é professor da Escola de Negócios da Universidade Positivo (UP).

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