Não se pode esperar que escritores estrangeiros cheguem ao Brasil e já saibam que a historiografia e a antropografia nacionais estão em atividade criadora e rebelde diante das narrativas estereotipadas que dominam o panorama jornalístico e acadêmico nacional. Outrossim, não se espera de um gentil lusitano se gabar de seu estado de ser atual, mas soa inconsequente ouvir choramingues inconvincentes sobre o Brasil ter que purgar o mal do estupro coletivo que o teria constituído. 5k1ne

Nesses tempos desmantelados em que vivemos, se Camões ressurgisse por uma nuvem quântica – quem sabe isso não existe! – levaria uma baita cusparada na cara ou uma estocada no seu olho bom, pelo mal de cantar a valentia e a proeza portuguesas; se fosse Vieira a declamar o surgimento do Quinto Império – que não é outro senão o Brasil multitudinário –, seria levado ao garrote e à fogueira por esses novos cães do cramunhão; e se o inefável luso austro-africano, com sua desbotada autocomiseração, renascesse em um dos seus avatares, seria escorraçado aos gritos de fascista da última tabacaria que resta em Lisboa.

“Ai, esse coqueiro que dá coco, onde eu amarro a minha rede”. Ah, a licença poética: qual o mineiro que amarraria sua rede num coqueiro?

Mercio P. Gomes é antropólogo e autor do livro O Brasil Inevitável.