Caso Bolsonaro seja reeleito, muitos políticos próximos a ele apostam que ele escolherá como sucessora de Aras sua atual vice, Lindôra Araujo, que tem rechaçado várias tentativas de investigar o presidente e seus aliados, alegando falta de materialidade dos crimes apontados.

Até o momento, entre os candidatos à Presidência mais bem posicionados nas pesquisas de intenção de voto, Simone Tebet (MDB) foi a única a sinalizar que escolherá a partir da lista tríplice, caso eleita. “Uma das razões por que acho que a escolha do procurador-geral tem que estar na lista, e o presidente da República tem tantos poderes, [é que] ele não precisa tirar alguém da cartola que não esteja na lista”, disse a senadora numa sabatina em junho realizada pelo portal G1.

Na sua vez de ser sabatinado, Ciro Gomes (PDT) não se comprometeu com o modelo. “Eu vou buscar aquele que entre os titulados formalmente tenha aquilo que a Constituição pede: notório saber jurídico, reputação ilibada e capacidade de representar um Ministério Público que eu sonhei e ajudei a construir, e que está sendo desmoralizado pelos abusos, de omissão, como no caso do Aras, ou, porque embaixo, você não tem ideia do Brasil profundo que eu conheço.”

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O que dizem defensores e críticos da lista tríplice

Atual presidente da ANPR, o procurador Ubiratan Cazetta diz que o modelo da lista é o mais transparente, porque só nele os candidatos se mostram publicamente, apresentam seus compromissos abertamente, de modo que os membros do MPF, que conhecem bem a trajetória de cada um dentro do órgão, avaliem se podem mesmo cumprir com seus planos.

“O outro modelo é opaco: não se sabe exatamente quem são os candidatos, quais seus compromissos e como são escolhidos. Então, para não nomear um amigo, mas sim alguém independente, isso só pode ser feito no modelo transparente”, disse à Gazeta do Povo.

Cazetta destaca que o modelo de lista é aplicado para escolher os chefes das 26 unidades do Ministério Público estadual, e também dos demais ramos do MP: Militar, Trabalhista e do Distrito Federal. Esse modelo não foi adotado para o MPF porque, até 1988, o procurador-geral também acumulava o cargo de advogado-geral da União, daí sua ligação mais próxima com o presidente, que o escolhia como qualquer outro ministro do governo.

Críticos do modelo, no entanto, ressaltam que a Constituição dá ao presidente livre escolha justamente para permitir que ele indique alguém alinhado com a política criminal que ele defendeu em sua eleição para o Executivo, e que foi referendada pela maioria dos eleitores. Também apontam o risco de que sejam escolhidos para a lista tríplice apenas aqueles candidatos propensos a oferecer aos procuradores o máximo de benesses para a própria carreira, adotando uma pauta corporativista distante dos interesses da sociedade.

O presidente da ANPR rechaça essas objeções, afirmando que, nos estados, não está comprovado que os chefes dos MPs, escolhidos pelo governador a partir da lista, só se preocupem com os interesses da carreira. Em relação à política criminal, alega que trata-se de uma questão definida pelo Congresso e que o PGR atua em observação à lei aprovada.

O advogado criminalista Davi Tangerino, doutor em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP) e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), concorda com o diagnóstico da ANPR. Para ele, o modelo de livre escolha permite a cooptação do procurador-geral, para que atenda aos interesses e proteja o presidente da República. Mas não considera que o único modo de evitar isso seja a indicação a partir da lista tríplice.

Ele não se opõe, necessariamente, ao modelo. Só considera que, caso o presidente não identifique nos nomes apresentados um perfil próximo da política criminal pela qual foi eleito, ele possa optar por alguém de fora dela. Isso porque um procurador-geral que, por exemplo, seja contrário ou favorável à criminalização do uso de drogas e ao armamento da população, pode ter influência no debate caso o STF venha a decidir sobre a constitucionalidade de políticas públicas relacionadas a esses temas – a PGR sempre pode pedir à Corte a revogação delas ou opinar em ações que as contestem. Além disso, tem poder istrativo para organizar o MPF de modo a priorizar ou não a atuação do órgão nesses campos.

“O Ministério Público é um órgão de Estado e a escolha da cúpula é do presidente com validação do Senado. Portanto, é totalmente legítimo que o presidente escolha quem seja alinhado com a política de Estado que aquele presidente imagina para o MP. Só que isso precisa ter dois cuidados: primeiro, é preciso ter transparência do que esse presidente espera desse procurador-geral, para que haja controle, inclusive do Senado. E dois: precisamos criar mecanismos para que se o procurador-geral for cooptado pelo presidente, não se crie um dilema institucional”, afirma Tangerino.

Entre esses mecanismos, já se discute no STF e no Congresso se é possível recorrer das decisões em que o procurador-geral arquiva investigações contra o presidente e seus aliados. Atualmente, quando a PGR considera que não há crime ou provas contra uma autoridade investigada, o arquivamento é quase obrigatório por parte do Supremo.

Há uma ação na Corte e uma proposta no Congresso para que essa decisão seja ível de recurso, de modo que a decisão final fique com o Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF), órgão istrativo de cúpula do qual fazem parte o procurador-geral e outros nove subprocuradores.