Em sua perspectiva, ao longo da pandemia, o Brasil, como um todo, não apenas a União, considerou a educação como atividade essencial? Deu a ela a importância devida?
Maria Helena Guimarães de Castro: Em março do ano ado, todas as escolas fecharam. Em abril, tínhamos quase 2 bilhões de estudantes fora da escola no mundo todo. Os países começaram a voltar às aulas gradativamente. Nosso grande erro foi a demora em retomar as aulas. Aprovamos o 1º parecer do CNE em maio de 2020, o 2º, em julho, com a expectativa de que todos voltassem as aulas já em agosto, e havia clara orientação sobre reorganização do calendário, sobre como computar atividades remotas. Todas essas orientações foram feitas pelo CNE em conjunto com conselhos estaduais e municipais.
Alguns sistemas de ensino voltaram às aulas em outubro. Enquanto muitos outros, não. É realmente absurdo que, em algumas situações, alunos ficaram um ano sem aula. Há apenas um país que cancelou o ano de 2020, que foi a Bolívia. Mas a maioria dos países desenvolvidos voltou às aulas já em setembro. Aqui no Brasil, muitos não voltaram e isso, na minha perspectiva, é um erro, porque gera uma maior perda de aprendizagem para os alunos.
Espero que agora todos retomem as atividades presenciais, mesmo sabendo que vamos continuar convivendo com atividades remotas, turmas pequenas para evitar aglomeração, alunos com máscara, respeitando os cuidados sanitários. Eu sou absolutamente a favor da volta às aulas no estado de São Paulo.
É da alçada do CNE fazer mais alguma coisa pelo retorno das aulas? E o que cabe ao CNE, neste sentido?
Maria Helena Guimarães de Castro: Não. O Conselho já fez tudo que era possível. Agora, está nas mãos dos estados e municípios e dos sistemas de ensino a decisão de retorno das aulas, de acordo com a orientação das autoridades sanitárias. Não há mais o que o CNE possa fazer. O que podemos, contudo, é realizar um debate sobre o ensino híbrido na retomada das aulas e apoio ao replanejamento curricular. Pretendemos fazer isso na sessão plenária de fevereiro.
Como recuperar ou amenizar os prejuízos que a pandemia causou à educação? Como lidar com os gargalos?
Maria Helena Guimarães de Castro: O mais importante é a recuperação da aprendizagem a partir de uma avaliação diagnóstica. É o primeiro o. Precisamos identificar os problemas, oferecer recuperação da aprendizagem, uma vez que os alunos têm diferentes ritmos de aprendizagem, há uns com mais facilidade e outros, menos.
A partir dessa recuperação, a escola deve se reorganizar do ponto de vista do currículo e fazer avaliações formativas, processuais ao longo do ano, acompanhar cada aluno, envolver famílias, conversar com os pais, fazer bom trabalho de formação continuada com professores. Só assim conseguiremos chegar ao final de 2021 numa situação melhor, com aprendizados assegurados. Mas, de fato, acredito que só vamos conseguir superar esses gargalos no final de 2022.
Mas precisaremos esperar pelo Saeb para fazer essa avaliação diagnóstica? Estados e municípios não possuem suas próprias ferramentas para isso?
Maria Helena Guimarães de Castro: Vários estados estão aplicando suas avaliações diagnósticas agora, já em janeiro. Mas uma avaliação nacional só será feita no fim do ano. Não há como o Inep aplicar agora, até porque isso dependeria de uma série de coisas, como a elaboração de provas e preparação por parte das escolas, que nem retornaram às aulas.
Para muitos interlocutores, o CNE acabou sendo mais protagonista do que o MEC em 2020. A pasta foi acusada de omissão, de não gerir uma estratégia nacional de combate aos reflexos da pandemia na educação. Na sua perspectiva, faltou articulação do MEC com o próprio CNE? Quer dizer, havia muito mais coisas que poderiam ter sido feitas no âmbito da educação?
Maria Helena Guimarães de Castro: Acho importante que o MEC tenha um papel de coordenação dessas ações. Percebo que, agora, a equipe da Secretaria de Educação Básica (SEB) está procurando fazer uma articulação com estados e municípios. A troca de equipe no ano ado acertou o protagonismo do MEC, com certeza.
Acredito que o ministério está fazendo um esforço no sentido de coordenar essas ações. Isso é importante e é o que a Constituição prevê, ou seja, que o MEC tenha papel de coordenação das políticas nacionais, respeitando autonomia dos entes locais.
Sobre a continuação da implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e do novo ensino médio neste ano, qual é a sua perspectiva, professora? Isso deve se dar como o esperado? Será possível implementar e revisar dentro do tempo previsto?
Maria Helena Guimarães de Castro: Três estados brasileiros já aprovaram seus currículos, 17 estão em finalização e 5 em consulta pública. A previsão é que até abril todas as unidades tenham seus currículos de Ensino Médio aprovados e alinhados à BNCC. Cada estado precisa elaborar, escrever, preparar, aprovar e discutir sua proposta curricular. São Paulo, por exemplo, já começa a implementar agora. Espírito Santo prevê início da implementação também em 2021. E, a partir de 2022, todos os estados brasileiros deverão iniciar a implementação do novo Ensino Médio.
Há, também, um esforço no sentido de o Inep apresentar um cronograma do novo Enem, que deverá acontecer em 2024. Um novo Enem que conte com uma etapa obrigatória para todos, uma segunda etapa com itinerários formativos e eletivas. Isso deve acontecer em 2024, por isso o Inep precisa preparar as matrizes de avaliação do novo Enem, a fim de que escolas tenham mais segurança na implementação do novo Ensino Médio.
Sobre a revisão da BNCC dos anos iniciais, a senhora acredita que isso deve ocorrer dentro do tempo esperado? A pandemia pode interferir na data prevista para isso acontecer, isso é, a previsão legal é de revisão após cinco anos da implementação. Neste caso, 2025?
Maria Helena Guimarães de Castro: Acredito que isso já está ocorrendo. Anos iniciais e finais já estão começando. Muitos estados e municípios já começaram em 2020, e 2021 é realmente o ano de implementação da BNCC da educação infantil. O livro didático alinhado à base já chegou nas escolas. O MEC vai comprar agora materiais do PNLD do ensino médio. Estou otimista de que haverá um forte empenho das redes para preparar professores e para dar continuidade à implementação da base. Isso foi prejudicado em 2020, mas deve começar pra valer nesse ano de 2021.
2022 é o último ano que todos estados deverão implementar a BNCC do novo ensino médio. Dos anos iniciais e finais, é 2021. A revisão só será feita cinco anos após a implementação. Só pode acontecer em 2025, porque a base foi aprovada em 2017, lá está que a revisão seria após cinco após o início da implementação. Em 2018 e 2019, foram anos de formação continuada e elaboração dos currículos, e aprovação pelos conselhos. Todos os estados e municípios aprovaram seus currículos de educação infantil anos iniciais e finais.
Em 2021, é o ano de início da implementação da BNCC da educação infantil anos iniciais e finais. Em 2022, é ano de início da implementação do novo ensino médio. Não dá pra falar em revisão da BNCC antes de cinco anos da sua implementação, como está previsto em documento aprovado e homologado na norma nacional, que rege a BNCC, que é fruto de discussão de quatro anos, que ouviu toda a sociedade brasileira, inúmeras audiências públicas, recebeu todas as críticas, sugestões, e aprovou por um voto contrário a BNCC em 2017.
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