O economista Rafael Perez, da Suno Research, aponta que há uma tendência de aumento nos gastos públicos que cria problemas para o fechamento das contas do governo.
A expectativa é de que, neste ano, haja déficit primário de 1% do PIB, segundo a mediana das projeções do mercado. Para 2024, quando a meta definida pelo novo arcabouço é de resultado zero (nem déficit, nem superávit), as expectativas apontam para saldo novamente negativo, de 0,8% do PIB.
Isso significa que os gastos do governo, mesmo sem contar o serviço da dívida pública, vão superar as receitas tanto em 2023 quanto em 2024. Novos déficits, ainda que um pouco menores, são esperados também para 2025, 2026 e 2027.
Vale destacar que, nos últimos dois anos, o setor público consolidado – que inclui, além do governo federal, as istrações estaduais e municipais e as empresas estatais – registrou superávit primário nas contas. Ou seja, arrecadou mais do que gastou. Em 2021, a conta fechou positiva em 0,7% do PIB, segundo o Banco Central. Em 2022, o saldo foi de 1,3% do PIB.
O cenário, porém, virou em junho deste ano, quando foi registrado o primeiro déficit acumulado em 12 meses desde outubro de 2021.
A alta nos gastos contribui para pressionar o endividamento público. Depois de cair do pico de 87,6% do PIB em novembro de 2020, em meio aos gastos com a pandemia, para 72,9% do PIB no fim de 2022, a dívida voltou a subir neste ano. Em julho, estava em 74,1%, e a expectativa do mercado é de que ela continue subindo, chegando a 75,9% do PIB até dezembro, segundo a mediana das projeções coletadas pelo boletim Focus, do BC.
Os problemas tendem a se estender para os próximos anos, mesmo com a limitação de crescimento real (acima da inflação) dos gastos públicos federais a 2,5% ao ano, conforme prevê o arcabouço fiscal.
As expectativas de mercado sinalizam que uma estabilização no endividamento público somente acontecerá por volta de 2031 ou 2032, no patamar de 88% do PIB.
“A entrada em vigor do arcabouço fiscal reduziu as chances de explosão da dívida pública, contudo, ele é muito dependente da arrecadação”, destaca Perez.
A esperança do governo Lula para melhorar o cenário das contas públicas não a por corte nos gastos, mas apenas por aumentos na arrecadação. “Foi uma prática comum nos outros governos do PT, como os dois mandatos anteriores de Lula e o de Dilma Rousseff”, diz Cruz.
Essa estratégia tem obstáculos. Uma delas é de que o Legislativo não se mostra animado a discutir aumentos na carga tributária. Ela alcançou 33,7% do PIB no ano ado, segundo o Tesouro Nacional, a taxa mais alta da série histórica iniciada em 2010.
A consultoria política Eurasia aponta que duas propostas de arrecadação adicional têm mais chances de ar pelo crivo do Legislativo. São as que tratam da tributação dos fundos offshore (PL 4173), apresentada em 29 de agosto, e dos fundos fechados (MP 1184), que aguarda a instalação da comissão mista no Congresso. Mesmo assim, o governo terá de fazer algumas concessões.
Outra aposta do governo, a extinção das deduções do Imposto de Renda nos Juros sobre Capital Próprio (J), corre o risco de ser aprovado só no ano que vem, aponta a consultoria. “Uma solução intermediária que restrinja a abrangência das atuais deduções é o mais provável”, destacam os analistas Christopher Garman e Daniela Teles.
Dois trunfos que o governo contou em anos anteriores para equilibrar as contas públicas e, até mesmo, fechá-las no azul não estão mais disponíveis, pelo menos, em 2023. “No ano ado fomos beneficiados pelos royalties do petróleo e pela inflação alta, que acabou sendo camarada com o governo”, diz o economista-chefe da Warren Rena, Felipe Salto.
Outro provável complicador para o governo, no ano que vem, será o de não contar com um crescimento mais robusto da economia, o que impacta na arrecadação.
Se, para este ano, a mediana das projeções do Focus sinaliza para crescimento de próximo de 3% no PIB, as projeções para 2024 são de uma expansão de pouco menos de 1,5%. “As receitas não vão aumentar no mesmo ritmo [em 2024]”, afirma o economista da Suno Research.
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