Porém, o deputado lembra que grande parte dessas propostas teria resistência no Congresso, em especial a desindexação do salário mínimo, que ele também é contra. Uma alternativa ainda dentro desse caminho será desindexar somente a parcela acima do salário mínimo. Mas aí o espaço orçamentário aberto já cairia de R$ 30 bilhões para algo em torno de R$ 22 bilhões.
O segundo caminho, diz o deputado, seria mexer na regra fiscal para permitir que o Renda Brasil não entre na conta do teto de gastos. Essa alternativa, contudo, seria um “desastre” para o país, alertou o parlamentar. “Se ele [Bolsonaro] quiser partir para furar teto, vamos desequilibrar a nossa macroeconomia. Seria uma catástrofe. No momento atual, sem você ter uma situação fiscal que sinalize que a dívida [pública] será paga no futuro, romper o teto é um desastre. O dólar vai a seis reais. Os juros sobem. Não dá”, diz Rigoni.
É possível também que a equipe econômica sugira ao presidente criar o Renda Brasil pagando um benefício menor que R$ 300, mas ainda acima dos R$ 190 em média pagos às famílias beneficiárias do Bolsa Família. Mas o presidente vem dando demonstrações públicas que quer um benefício de R$ 300.
Fernando Schüler, mestre em ciências políticas e professor do Insper, lembra em artigo publicado na Gazeta do Povo que o auxílio emergencial de R$ 600 que está sendo pago neste ano criou uma situação inédita no país. O Brasil conseguiu reduzir a pobreza extrema em meio à pandemia e a uma queda histórica da economia.
Não à toa, o presidente aumentou a sua popularidade nas camadas mais pobres da população e entre os eleitores das regiões Norte e Nordeste. E agora ele está de olho em trocar o auxílio emergencial por um programa de renda básica que tenha o mesmo efeito social, político e econômico. Porém, a criação do benefício esbarra no Orçamento e no teto de gastos, e fica a questão sobre o que vai prevalecer.
O líder do Novo, deputado Paulo Ganime (RJ), diz que entende o presidente quando ele fala que o novo programa não pode tirar do “pobre” para dar ao “paupérrimo”. Mas afirma que falta a Bolsonaro uma compreensão da situação fiscal do país.
“Não é uma questão de ideologia. É uma questão matemática. A gente sabe que os recursos do país são limitados. Toda política pública tem que ser muito bem focalizada por causa das restrições orçamentárias. A gente não pode dar brecha para tirar o teto de gastos ou qualquer outro mecanismo que garanta a responsabilidade fiscal”, disse o deputado à reportagem.
Ele diz que o presidente vem dando sinais que vai “abraçar o populismo e tentar ganhar voto pensando na reeleição”. O sinal mais recente, avalia Ganime, foi a declaração de que não vai mexer no abono, um programa que diversos estudos apontam ser mal focalizado, para não prejudicar a renda de 12 milhões de pessoas. “O que vai prevalecer no final? Eu não sei. Mas o que a gente tem visto é uma sinalização de o presidente ir para o caminho do populismo.”
Vice-líder do governo no Senado e aliado do Bolsonaro, o senador Chico Rodrigues (DEM-PE) minimizou a saia justa criada pelo presidente. Ele explicou que, de um lado, está Guedes tentando viabilizar recursos para o programa social sem romper nenhuma regra fiscal e sem ultraar o teto de gastos. Do outro, o presidente tentando garantir renda a milhões de brasileiros. E que eles vão chegar a um acordo.
O senador nega que esteja ocorrendo uma “fritura” do ministro para forçá-lo a pedir demissão, assim como aconteceu com o ex-juiz federal Sergio Moro. “Não é uma fritura. O presidente está procurando que se encontre uma equação que beneficie mais 8 milhões de brasileiros, além daqueles que já recebem o Bolsa Família. Vai se chegar a um acordo logo. Nós todos torcemos para que a equipe econômica consiga viabilizar esse benefício em 300 reais”, afirmou Rodrigues.
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O mercado financeiro continua apreensivo. Na última quarta-feira (26), o Ibovespa atingiu forte recuo, chegando a cair abaixo dos 100 mil pontos, e o dólar fechou em R$ 5,60. Já na quinta-feira (27) houve uma leve recuperação, com o Ibovespa fechando em 100.623,64 pontos e o dólar ficando em R$ 5,57. Ainda assim, a crise político-econômica não saiu do radar dos investidores.
Fábio Klein, economista da Tendências Consultorias, disse à Gazeta do Povo que o mercado espera sinais mais concretos do governo de manutenção das regras fiscais, já que está crescendo o embate entre a “cabeça política” e a “cabeça econômica” do governo.
“A elevação da popularidade do Bolsonaro tornou-o mais forte. Ele está se sentindo com uma caneta BIC mais poderosa. A política está ganhando mais força dentro do governo. Está havendo um certo populismo fiscal. E os riscos fiscais estão crescendo a cada dia”, resumiu o especialista.
Há exatamente duas semanas, Bolsonaro disse que Guedes tem 99,9% de poder sobre os temas da sua pasta. Mas lembrou: "Tenho que ter 0,1% de poder de veto”.