A influência das eleições americanas
A avaliação de Barral é que uma eventual eleição do democrata Joe Biden trará um pouco mais de previsibilidade para as ações americanas. “Ele é um político mais ortodoxo nesse sentido, embora deva continuar uma disputa com a China, em termos comerciais, medidas de defesa comercial, antidumping, contra subsídios que aumentaram muito nos Estados Unidos. Mas, ao mesmo tempo, [deve haver] uma aproximação maior dos Estados Unidos com a Europa e uma maior ponderação com em temas internacionais, inclusive em temas ambientais”, diz.
No que diz respeito ao Brasil, Barral lembra que Biden pouco mencionou o país durante a campanha e, quando o fez, foi em relação a temas ambientais. A tendência é de um aumento de pressão sobre o Brasil, principalmente em relação a meio ambiente e desmatamento, seguindo a tendência europeia.
Já uma reeleição de Donald Trump manteria esse bom nível de relacionamento que existe atualmente e levou até a recente de um acordo de facilitação de comércio entre os dois países. “Não é um acordo crucial no sentido de livre comércio, mas é um acordo que facilita a ação de empresas e investimentos recíproca entre os dois países”, afirma.
No entanto, ele avalia que a América Latina e o Brasil não são prioridades nem para Trump, nem para Biden. “Há questões específicas dos Estados Unidos em relação à China em primeiro lugar, Europa, Rússia, países do leste asiático que têm mais relevância na agenda da política e econômica externa americana do que a América Latina”, diz.
Uma meta do governo de Jair Bolsonaro é a de estreitar os laços com os americanos. Apesar de o Brasil fazer algumas concessões almejando trocas ou indicações, como é o caso do ingresso na OCDE, os EUA recentemente sobretaxaram produtos brasileiros como o aço e o alumínio.
Barral avalia que esses casos não foram direcionados diretamente ao Brasil, mas sim fruto de medidas adotadas contra a China ou genericamente ou ainda resultado de defesa comercial. “Não quero minimizar a medida, mas são naturais do comércio internacional. Isso afeta uma parcela muito pequena do comércio entre Brasil e Estados Unidos. E claro que a negociação é permanente”, diz.
Analisando o histórico da relação entre os dois países, Barral pondera que o volume de contenciosos hoje é pequeno em comparação ao que já ocorreu. Ele cita como principais casos a disputa sobre o algodão e os embates da década de 1990 envolvendo aço e suco de laranja. “É interessante que a própria queda do comércio bilateral acabou diminuindo o número de contenciosos entre os dois países”, afirma.
Para ele, o Brasil fez várias concessões visando benefícios futuros, como posição na Otan e alinhamento em organizações internacionais, que podem não ser as melhores soluções para o país, mas fazem parte de negociações gerais.
“Os próximos os seriam abrir mercado nos Estados Unidos para produtos brasileiros. E aí esse é um processo longo, que dependeria não só de ações pontuais para produtos como carnes, mas eventualmente a discussão de um acordo de comércio, que foi mencionado pelo governo Trump e nunca se efetivou durante esse governo, e nós sabemos que terá muita dificuldade para se efetivar principalmente em um congresso dominado por democratas”, pondera.
As relações entre Brasil e China são afetadas diretamente por uma relevante questão estrutural – a disputa entre os chineses e os EUA–, a força da Ásia como polo dinâmico do comércio exterior e a atual conjuntura do governo Bolsonaro, que é de um certo preconceito para com a China.
Atualmente, a China é o destino de mais de 30% as exportações brasileiras. “É um nível alto de vinculação a um país, de um lado, mas, ao mesmo tempo, acabou ajudando muito a balança comercial brasileira em 2020, inclusive pelo alto preço de commodities ao longo desse ano”, diz. Para ele, o país não pode esquecer de outros grandes mercados vindos da Ásia, como a Tailândia, a Indonésia, o Paquistão e a Índia.
Sobre a relação entre Brasil e China, Barral pondera o certo preconceito do governo com o país, mas lembra que os chineses precisam das importações brasileiras, sobretudo soja e minério de ferro, e continuarão precisando. “Agora, quais poderão ser os impactos para o investimento chinês no Brasil? E o Brasil precisa também desses investimentos, sobretudo na área de infraestrutura”, avalia. Para ele, essa pergunta está em aberto, e condicionada a posição que o país adotará em relação à China.
Um exemplo é a questão do 5G. A disputa tecnológica está dividindo o globo entre os países que aceitarão a entrada da Huaweii e os que vetarão. “A reação do governo brasileiro foi não decidir, esperar ar para o ano que vem e ver qual será a nova postura do governo americano que talvez seja menos belicosa se o Biden ganhar”, diz. Para ele, nessa situação, o melhor que o Brasil tem a fazer é adotar uma postura de neutralidade. “Não sabemos se o Brasil vai conseguir isso, principalmente em temas como esses que terão relevância para os dois lados”, afirma.
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