No fim de setembro, durante evento na cidade de Teotônio Vilela (AL), ao lado de Bolsonaro, Lira também incorporou o discurso do presidente de que seriam os estados os responsáveis pela alta no preço dos combustíveis. “Sabe o que é que faz o combustível ficar caro? São os impostos estaduais. Os governadores têm que se sensibilizar”, falou o parlamentar.

Após críticas de governadores, o deputado classificou o tributo como um “primo malvado” na formação do preço final dos combustíveis. “Nós nunca dissemos que é o ICMS que ‘starta’ o aumento do combustível. Para que isso fique claro.”

Câmara acelera alteração na cobrança de ICMS sobre combustíveis

O desgaste que o preço dos combustíveis tem causado fez com que a busca por uma maneira de conter as altas se tornasse urgente para o governo, que obteve o apoio do Legislativo no tema. O substitutivo ao projeto de lei complementar (PLP) 11/2020, que promove mudanças na base de cálculo do ICMS sobre combustíveis, entrou em pauta e foi aprovado na Câmara dos Deputados a toque de caixa.

Outras matérias importantes, como a PEC dos Precatórios e a criação do Auxílio Brasil, programa que deve substituir o Bolsa Família, acabaram ultraadas na fila de prioridades.

O projeto aprovado pelos deputados, que ainda precisa do aval do Senado e da sanção do presidente da República, prevê que o ICMS e a ser cobrado na forma de um valor fixo por litro de gasolina, etanol e diesel, que será reajustado uma vez por ano. Na prática, o imposto fica invariável durante o ano frente às variações do preço do combustível ou de mudanças no câmbio.

Além disso, o cálculo desse valor leva em consideração a média dos preços dos combustíveis praticados ao longo dos dois exercícios imediatamente anteriores, e não pode exceder a alíquota aplicável em 31 de dezembro do último ano. Hoje, o cálculo é feito com base no chamado preço médio ponderado ao consumidor final (PMPF), levantado a cada 15 dias.

O efeito da mudança deve ser limitado. No relatório do projeto, o deputado Dr. Jeziel (PL-CE) argumenta que com a entrada em vigor das novas regras o preço final praticado ao consumidor deve cair, em média, 8% para a gasolina comum, 7% para o etanol hidratado e 3,7% para o diesel B.

No último dia 8, dias antes da votação, a Petrobras anunciou reajuste de 7,9% no preço da gasolina vendido às distribuidoras, acumulando alta de 31% em 2021. No fim de setembro, a estatal já havia elevado o valor médio do diesel em 8,89% (28% no ano).

Por outro lado, a medida deve gerar perda de arrecadação para estados e municípios. Estudo da Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite) estima em R$ 24,1 bilhões a queda anual na receita dos entes federativos, sendo R$ 12,7 bilhões da gasolina, R$ 7,4 bilhões do diesel e R$ 4 bilhões do etanol.

Além disso, uma eventual queda futura no valor dos derivados de petróleo no mercado internacional poderia gerar efeito inverso: o ICMS continuaria a ser cobrado sobre uma base maior, deixando de refletir as reduções em curto prazo.

O Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) criticou as alterações. A entidade defende que a solução para o problema a por uma mudança na política de preços da Petrobras e pela reforma de todo o sistema tributário.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), prometeu “boa vontade” na apreciação do PLP 11/2020 na Casa. “Precisamos estabilizar o preço dos combustíveis, tornar o preço mais palatável para o desenvolvimento do país. Não tem como desenvolver o país com este preço. O Senado está muito aberto às boas propostas”, disse Pacheco.

Ele disse ainda que a Petrobras “precisa ter elementos para colaborar com um preço mais ível”, lembrando que a empresa tem “uma função social”.

Deputados discutem outras medidas para conter alta de preços

Enquanto isso, a Câmara trabalha em outras frentes para atacar os preços. Nesta sexta-feira (15), a Comissão de Finanças e Tributação aprovou parecer sobre o PLP 10/2020, que impõe um limite às alíquotas do ICMS sobre combustíveis.

De acordo com o texto, o tributo incidirá, no máximo, em 20% para a gasolina, 10% para o diesel e 15% para o etanol. Caso entre em vigor juntamente com o PLP 11, este será o teto a ser considerado na definição do valor fixo do ICMS a partir de 2022. Hoje os estados têm autonomia para definir as alíquotas. No caso da gasolina, por exemplo, o tributo vai de 25% a 34%, dependendo da unidade federativa.

Outra proposta que está à mesa é a da criação do chamado Fundo de Estabilização dos Preços dos Derivados do Petróleo (FEPD), que seria abastecido por um imposto cobrado sobre a exportação do petróleo bruto. A ideia é que os recursos dessa reserva sejam utilizados para subsidiar o valor dos combustíveis, contendo as altas no curto prazo.

A alternativa consta do projeto de lei (PL) 750/2021, do deputado Nereu Crispim (PSL-RS) e que está em análise na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços. Em uma audiência no colegiado, o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) se manifestou contrariamente à ideia, que, segundo a entidade, afastaria investidores e contrariaria princípios de livre mercado e livre concorrência.

Representantes de caminhoneiros e o ex-consultor legislativo Paulo César Lima defenderam o modelo. Apesar disso, o relator Geninho Zuliani (DEM-SP) apresentou parecer preliminar pela rejeição do projeto.

Custo elevado de combustíveis reacende discussão sobre privatização da Petrobras

No dia seguinte à aprovação do PLP 11/2020, Bolsonaro disse, em entrevista à Rádio Novas da Paz, de Pernambuco, que o texto não é o ideal, mas parabenizou Lira por ter conseguido encaminhar a votação. E citou a possibilidade de privatizar a Petrobras como uma forma de conter os preços.

“É muito fácil: aumentou gasolina? Culpa do Bolsonaro. Eu já tenho vontade de privatizar a Petrobras. Tenho vontade. Vou ver com a equipe econômica o que a gente pode fazer. O que acontece? Eu não posso melhor direcionar o preço do combustível, mas quando aumenta, a culpa é minha”, disse.

Uma eventual venda do controle acionário da Petrobras, que tem capital aberto, mas tem a União como sócia majoritária, precisaria do aval do Congresso Nacional. O assunto já havia sido levantado por Lira em uma entrevista no dia anterior à CNN Rádio.

“Há uma política que tem que ser revista, porque hoje ela [Petrobras] não é pública nem privada completamente. Só escolhe os melhores caminhos para performar recursos e distribuir dividendos. Então não seria o caso de privatizar a Petrobras? É hora de discutir qual é a função da Petrobras no país. É distribuir dividendos?”, questionou.

A ideia de desestatizar a companhia petrolífera é defendida também pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Em um evento promovido pela International Chamber of Commerce – Brasil (ICC-Brasil) há duas semanas, ele defendeu que a Petrobras “entrasse na fila” de vendas. “Qual o plano para os próximos dez anos? Continuar com as privatizações: Petrobras, Banco do Brasil, todo mundo entrando na fila, sendo vendido e isso sendo transformado em dividendos sociais”, afirmou.

Esta semana, em entrevista a jornalistas em Washington, nos Estados Unidos, Guedes voltou a falar sobre o assunto. “Quando o preço do combustível sobe, os mais frágeis estão com dificuldade, não estão? Que tal se eu vender um pouco de ações da Petrobras e der para eles esses recursos?”, sugeriu.

“Se a gente fizer um fundo, colocar lá umas ações da Petrobras, da Caixa Seguridade, de empresas estatais que a gente queira. Se não quiser privatizar, tudo bem, paga dividendos sociais. Agora, se quiser privatizar, aí sim, vende.”

Use este espaço apenas para a comunicação de erros