Paradoxalmente, o que há de mais valioso no novo trabalho do cineasta que completou 70 anos é a sua absoluta imperfeição, suas lacunas narrativas, suas caprichosas mudanças de registo, de pontos de vista e até de gêneros, seus – em suma – devaneios. Moretti mistura o metacinemático com a crítica política, o drama íntimo, a psicanálise, a comédia mais maluca... E até o musical, com direito a uma homenagem ao cantor e compositor Franco Battiato (1945-2021).
Nessa espécie de caos narrativo você pode curtir – porque o verbo desse filme é curtir – um filme engenhoso, inteligente, ácido e 100% autoral. E é, acima de tudo, nostálgico e reflexivo. Uma dissecação nítida da agem do tempo e no que ela influencia ideias e visões de mundo.
Entre exageros e piadas, Moretti fala, no fundo, da necessidade de relativizar as mudanças sociais e culturais, de retirar intensidade e dramaticidade daquilo que sempre foi feito de uma forma e agora é feito de outra, do perigo de ser inflexível em questões banais. Ao mesmo tempo, sem cair no preconceito de idade ou num devaneio acrítico pela novidade, simplesmente pelo fato de ser novidade.
Há coisas novas – no cinema, na cultura, na educação e nos costumes sociais – que nos fazem dar os para trás, e existem outras que representam um impulso. É por isso que Moretti, com abundantes doses de ironia, ataca tanto o deslumbramento infantil do novo como a obstinação do velho.
Talvez nem seja preciso dizer que O Melhor Está por Vir não poderia existir sem Moretti como protagonista. Mas, para compor essa tela brilhante, o cineasta também precisou do carisma e da competência de uma atriz como Margherita Buy, perfeita em sua personagem.
© 2024 Aceprensa. Publicado com permissão. Original em espanhol.
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