Bom Gourmet Negócios: A Fazenda Futuro foi uma das primeiras da América Latina a desenvolver produtos plant based com este diferencial de ser realmente um substituto à proteína animal, mas com aparência e sabor semelhantes aos originais. Foram apenas dois anos de crescimento para chegar onde chegaram. Como foi isso?
Marcos Leta: A Fazenda Futurou nasceu em maio de 2019 com investimentos próprios tanto meu quanto do meu sócio, e logo nos dois meses seguintes, vimos que tanto a marca como o produto tinham elasticidade pra crescer mais rápido tanto aqui no Brasil quanto para antecipar o nosso plano de exportação. Começamos então as nossas séries de captação com US$ 8,5 milhões em julho e agosto, e em setembro de 2020 algo em torno de US$ 21 a 22 milhões, totalizando US$ 30 milhões (mais de R$ 150 milhões) para anteciparmos os nossos planos comerciais e de marketing para mantermos a liderança de plant based no Brasil e expandindo a marca para fora do país. Então depois desses dois anos chegamos a 24 países, concentrado a maior parte do volume no Brasil e na Europa e entrando nos Estados Unidos daqui a no máximo dois meses.
Quando a Fazenda Futuro surgiu, com os primeiros investimentos próprios, a capacidade de produção era de 90 toneladas de alimentos. Depois, com os aportes das rodadas de investimento, ou a 150 toneladas. E hoje, de quanto é a produção destes seis produtos da marca?
Hoje a nossa produção está em 600 toneladas, sendo que, até o final do ano, 50% disso serão específicos para o mercado doméstico. Desde o começo da Fazenda Futuro nós tínhamos uma tese: o Brasil é uma potência no agronegócio, representa mais de 30% da produção mundial de alimentos, só que infelizmente vendemos muita commodity quando você olha os nossos vegetais. Então pensamos que, se conseguíssemos agregar tecnologia a esses vegetais, desenvolver fórmulas para vender em todos os países sem usar aromatizantes ou corantes artificiais, conseguiríamos desenvolver uma empresa global onde o vegetal vem do Brasil. Desde o início, todo o nosso planejamento de ingredientes a pelo nosso departamento jurídico para entender a legislação dos países onde estamos. Hoje eu consigo vender para o mundo todo, estamos de acordo com todas as legislações. Claro que tem um ou outro país em que temos que adicionar vitaminas, como no Canadá, por exemplo, só que a base do produto consegue ser vendida no mundo inteiro. O mercado árabe mesmo nós temos até certificado Halal, embora não precisássemos dele para vender lá. É um mercado que tem crescido bastante, somos líderes de plant based na rede Carrefour de lá.
Do porcentual que vocês exportam, de cerca de 300 toneladas, 80% vai para a Europa e o restante para outros continentes. Como é o mercado europeu para os produtos da Fazenda Futuro?
Estamos nas principais redes de varejo do país, como o Sainsbury’s, do Reino Unido (segunda maior do país); no Metro, da Itália, que é o maior varejista de lá; no Jumbo, que é o maior da Holanda, entre outros. Estamos conquistando os paladares dos jovens e dos que estão querendo diminuir o consumo de carne.
Marca é comercializada no exterior como Future Farm e Hacienda Futuro.
Fazendo um retrocesso de como era o mercado de carne vegetal antes de 2019, em que existiam basicamente hambúrguer de cogumelos, de soja e outros vegetais, hoje vemos um domínio considerável da Fazenda Futuro e a entrada de outras foodtechs no mercado e, até mesmo, de gigantes alimentícias de olho nesse crescente consumo. Como você vê essa aceitação dos brasileiros com a evolução dos produtos de origem vegetal?
Acho que o Brasil e os brasileiros ainda estão em um processo de amadurecimento, experimentando essas novas carnes, descartando e preferindo aquelas que o agradem mais em termos de sabor e textura – e buscando mais informações sobre como diminuir o consumo de proteína de origem animal. Quando você pega o próprio consumo per capita de carne do Brasil, ele vem diminuindo [queda de 14% segundo a Companhia Nacional de Abastecimento, seja pelo preço cada vez mais alto como pela mudança de hábitos] embora as exportações de carne do Brasil tenham explodido [37% em 2020 segundo a Conab]. Existem ondas de consumo de plant based, como a que tivemos dos hambúrgueres de cogumelo, de grão-de-bico, de feijão [na primeira década deste século], depois veio uma segunda onda que começou em torno de 2009 e 2010, de usar novas tecnologias para se extrair e chegar numa textura muito próxima da carne. E, por fim, essa onda em que estamos trabalhando hoje, de saudabilidade, que é entregar um produto cada vez mais saudável com baixo teor de sódio e de gordura comparado à de origem animal.
A questão preço ainda é um impeditivo? Porque vemos uma diferença grande entre o preço cobrado pelos produtos da Fazenda Futuro e dos concorrentes diretos no varejo, como uma caixinha de hambúrguer de 230g custando R$ 11 a R$ 13 enquanto que a de proteína animal de 670g custa R$ 14.
O preço ainda é um desafio no Brasil, infelizmente não temos os mesmos incentivos [fiscais] de produção de carne, e tem também a questão de escala e eficiência produtiva. Agora, quando você pega a Europa, por exemplo, estamos no máximo 15% mais caros que a proteína animal, porque a carne lá já é cara de qualquer forma. Mas, sim, o preço é um desafio no Brasil que vamos conseguir reduzir com volume, com os consumidores comprando mais, e aí se consegue diminuir o preço ao longo do tempo. A categoria tem crescido, os varejistas a adotaram tanto que, em uma grande rede, temos 25% de todo o share de hambúrguer bovino, não é uma categoria desprezável. Mas, obviamente, pra ela dar esse pulo de consumo é uma questão de tempo, não tem muita ciência. Os Estados Unidos, por exemplo, trabalham com plant based há 10 anos, a Europa iniciou lá atrás em 1970, com aquela leva de produtos com gosto de vegetal. Mas hoje, o paladar para produtos vegetais já está muito maduro, ela está nessa transição há seis a sete anos. O Brasil tem efetivamente dois anos apenas. Pode colocar o dinheiro que for, não se muda a cultura de um povo em dois anos. Geralmente a partir do quinto ano, do sétimo ano.
Acho que é um pouco utópico isso. Não adianta entrar e perceber que a tributação brasileira é alta e complexa, nós já sabemos disso. Eu adoraria que tivéssemos incentivos, há conversas para isso até mais longas do que a criação da categoria de carne plant based, mas até agora não saiu absolutamente nada. Sabemos que no Brasil não existe incentivo para o plant based, então temos que jogar com outras estratégias como aumentar volume, executar no supermercado, expandir a nossa malha de distribuição pra se conseguir produzir mais, tentar ser cada vez mais eficientes na produção para diminuir custo e não aumentar a margem e rear custos para o consumidor... Se você pegar o nosso produto, o Futuro Burger 1.0, 2,0 e o 2030, sempre mantivemos o mesmo preço porque aumentamos a tecnologia. As vezes melhoramos um ingrediente que é mais caro, mas tentamos manter ou diminuir o nosso custo a medida em que vamos aumentando o volume e melhorando a nossa tecnologia.
Para finalizar, o que a Fazenda Futuro planeja para os próximos dois anos?
Vamos continuar com os investimentos e a expansão de fabrica [no Rio de Janeiro] para mantermos a liderança no Brasil e ar o crescimento no exterior. Também aumentar os departamentos comercial e de marketing na Europa, e focar bastante no crescimento e desenvolvimento nos Estados Unidos, que é o maior mercado. Dos seis produtos que exportamos para o mundo todo, vamos para lá primeiro com o hambúrguer, a almôndega e a carne moída, e depois vão entrando os outros.